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Seguem os protestos na Nicarágua

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Por IELA em 06 de junho de 2018

Seguem os protestos na Nicarágua

Foto: La Prensa – Bloqueios somam 38 em todo o país

A Nicarágua segue vivendo o bem conhecido esquema do chamado “golpe suave” já vivido por outros países latino-americanos, como o Paraguai, Brasil e Venezuela. Tudo começou com uma ação do governo, que visava reformar a Previdência, baseado nos índices de envelhecimento da população e no déficit do setor. Daniel Ortega propunha a diminuição em 5% no valor das aposentadorias, e um aumento de 3,5% no montante que é pago pelos empregadores (passando de 19 para 22,5%) bem como na taxa paga pelos trabalhadores que passaria de 6,25 para 7%.  Os empresários protestaram, exigindo que a conta maior fosse para os trabalhadores. O governo não aceitou. Então, por conta dessa inconformidade empresarial, a mídia passou a incentivar o levante dos trabalhadores. E os protestos começaram.
Os primeiros atos vieram das universidades, com os estudantes de nível superior, e depois foram alcançando as ruas e os trabalhadores. Após as primeiras grandes manifestações o governo decidiu chamar uma mesa de diálogo, tentando encontrar alguma saída negociada. Mas, já estava em andamento o “golpe suave”, apoiado pelos empresários vende-pátria e organismo internacionais, que aproveitaram a onda para desestabilizar o governo, que, apesar de receber pesadas críticas de setores da esquerda, segue identificado como “esquerda” pela maioria. 
A pauta então se deslocou da reforma da previdência e passou a atuar no âmbito da “luta contra a corrupção”, ou seja, a mesma pauta que garantiu os levantes populares no Brasil, por exemplo. A partir daí acusações de todo tipo contra o presidente Daniel Ortega passaram a comandar a consigna de “fora Daniel”. E os protestos se aprofundaram em número e em violência. 
As manifestações de rua que começaram em abril atravessaram maio e seguem até hoje, com um saldo de mais de 110 mortes. Há pelo menos 38 pontos de bloqueio de ruas e estradas em todo o país. Só na última semana, na cidade de Masaya, foram 10 mortos e 62 feridos que resultaram dos confrontos com as forças da repressão e ação paramilitar. A acusação é de que as mortes têm sido causadas por paramilitares ligados ao governo ou não, mas também há casos de ação da Polícia Nacional. 
Segundo o militante sandinista Carlos Fonseca Terán, em entrevista na página Insurgente.org, as marchas realizadas na Nicarágua comportam vários perfis de trabalhadores. Há os que estão defendendo sim seus interesses de classe, há os que se manifestam por outras pautas legítimas, há os manipulados e há também grupos violentos, preparados por instituições da direita para realizar atos de vandalismo. E exatamente como nos protestos de rua na Venezuela os manifestantes agrediam os chavistas, na Nicarágua há agressões a todos aqueles que se mostram defensores do governo sandinista. Esses conflitos têm gerado feridos e mortos.
Carlos Fonseca aponta que quando a mídia divulga o número de mortos não esclarece quantos foram mortos em enfrentamento com a polícia e quantos foram pela ação das agressões que têm cobrado vida de ambos os grupos: direita e esquerda. “Não são massacres cometidos pelo governo e tampouco são apenas os orteguistas que praticam atos de violência. Há uma manipulação na informação”. 
Segundo Carlos o governo não seria ingênuo de incentivar atos violentos contra a população, pois isso certamente iria contra ele. Há uma ação deliberada de empresários e instituições de direita, diz. Ele é um dos que defende a tese de que o que vai em curso é um projeto de derrubada do governo democraticamente eleito, que não concede aos Estados Unidos e que quer que o empresariado nacional também dê a sua parte na proposta de reforma.
O governo tem feito apelos para o retorno à normalidade. Criou uma comissão para investigar os fatos violentos, autorizou a entrada de representantes de entidades internacionais que atuam na defesa dos direitos humanos e está disposto a dialogar. Mas, os protestos seguem e a violência também. 
No meio de todo esse processo de luta popular também se cruzam ações de criminosos comuns, que se aproveitam da confusão para roubar e saquear lojas, bem como assomam com força grupos paramilitares que sequestram, violentam e matam pessoas. Mascarados e fortemente armados eles são vistos pela população como “agentes do governo”, mas pode ser que não sejam. O governo insiste que esses grupos são parte do golpe e são financiados pela direita. No geral eles atiram desde cima dos prédios, como franco atiradores, ou então passando em velocidade com carros possantes.
Os levantamentos das barricadas em vários pontos do país também tem provocado o desabastecimento de produtos básicos bem como combustíveis para uma boa parte da população, acirrando ainda mais os protestos. 
O governo insiste na paz, mas a movimentação continua. E os países da América Central seguem reféns de uma realidade dura de mudar, que é a de serem sistematicamente cobiçados pelo império estadunidense. Isso faz com que seja de difícil constituição uma vida de paz e soberania. O exemplo de Cuba não pode ser repetido, insistem os Estados Unidos. E ainda que o atual governo sandinista não chegue nem perto de uma proposta socialista, o simples fato de ser representado pela bandeira “rojinegra” já é motivo para sua destruição. 
Assim, os erros cometidos por Daniel e a própria decisão de não aprofundar o caminho para o socialismo acabam sendo porta frágil e comprometem a possibilidade de um tempo de paz. Uma conjuntura complexa, mas absolutamente  de acordo com a proposta estadunidense de manter os países em sistemático conflito, conforme afirma a professora e pesquisadora  mexicana Ana Esther Ceceña, do Observatório Latino-Americano de Geopolítica. Ela mostrou, durante sua conferência nas Jornadas Bolivarianas, o mapa do mundo e todos os conflitos existentes, seja no modo “guerra quente” ou no modo “suave”. Ao observar o mapa, percebe-se que todos os que vivem confrontos sistemáticos, quentes ou suaves, estão localizados em regiões estratégicas para os Estados Unidos. 
 

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