Lula ataca os trabalhadores
Texto: IELA
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Ato em Florianópolis – Foto: Elaine Tavares
Hoje( 31.08) o Brasil sofreu um golpe de Estado.
Os notórios corruptos que organizaram o malabarismo jurídico que levou ao impedimento de Dilma e hoje tomam o poder representam tudo o que há de mais atrasado na política brasileira. Ao menos 39 dos 81 senadores possuem a ficha suja[1]. É mais do que natural, ao observar os sicofantas que retomam o protagonismo da política brasileira, o despertar de um senso de compaixão e solidariedade com Dilma e o PT.
A despeito disso, é preciso deixar este sentimento de lado, já que ele em nada colabora com a gigantesca tarefa que se inaugura no campo da esquerda brasileira. Façamos, portanto, as seguintes ponderações:
O golpe é midiático? Sim, mas não esqueçamos que a tal “batalha da comunicação” nunca alcançou patamar além de peça retórica dos programas de governo petistas. O Partido dos Trabalhadores jamais pretendeu fortalecer a rede pública de comunicação, nunca enfrentou o monopólio midiático global e fez questão de boicotar a transmissão do sinal da Telesur no País.
O golpe é judicial? Seguramente. No entanto, recobremos à memória que o PT nomeou dez dos onze juízes do STF e jamais ousou tocar na carreira do judiciário, cuja tradição histórica é de corte antipopular. O exagerado legalismo do Partido dos Trabalhadores, à revelia da conjuntura nacional e do clamor popular[2] fez com que o partido se orgulhasse de sustentar a insígnia de ser uma “esquerda responsável”. A realidade cobra seu preço e, atualmente, a direita brasileira prova que não tem qualquer escrúpulo, muito menos constrangimento, para atropelar a constituição: seja para simular um crime de responsabilidade e sacar a presidente da República em um julgamento eminentemente político; seja para flexibilizar o rigor do maior algoz de Dilma: a Lei de Responsabilidade Fiscal.[3]
O golpe é parlamentar? Sem dúvida. Dado pelos parlamentares alimentados pelo modelo de presidencialismo de coalizão, um dispositivo forjado pela classe política brasileira para limitar artificialmente os poderes do executivo e endossado pelo Partido dos Trabalhadores como único modelo viável para comandar o país. Lembremos que Temer possui ao menos 7 nomes fortemente ligados à administração petista – boa parte deles no primeiro escalão – entre ex-ministros, ex-líderes de bancada e presidentes de estatais[4]. Recordemos que Lula quis endossar a campanha de ninguém menos que Rodrigo Maia à presidência da Câmara, para evitar que Rogério Rosso, candidato de Eduardo Cunha, ganhasse o pleito. A velha máxima “o país é ingovernável sem o PMDB” provou-se real exatamente em seu sentido oposto: “o país é ingovernável com o PMDB”.
O golpe é cívico? Sim, arquitetado pela “sociedade civil organizada” (o eufemismo utilizado pelo liberalismo de esquerda e de direita para fazer referência à luta de classes). O latifúndio, que o PT turbinou durante sua administração, só ofereceu guarida para a defesa petista na figura de Kátia Abreu. Muito se diz que seu apoio se deve a uma antiga, sólida e fiel amizade entre as duas. Nada menos certo. O voto da grileira não poderia ser mais atravessado pelo mais puro pragmatismo. A miss motosserra rendeu homenagens à Dilma em seu discurso no Senado por ter sido a ex-presidente responsável pela concessão de R$ 43 bilhões de reais em subvenções para o agronegócio, além de ser considerada por Kátia Abreu a figura decisiva como entusiasta e articuladora do novo Código Florestal Brasileiro, aquele que em 2012 anistiou os latifundiários pelos crimes ambientais e relaxou os limites para a expansão da fronteira agrícola. A indústria, principal beneficiária da “política anticíclica” resultante da “nova matriz macroeconômica” do primeiro governo Dilma, só bancou o romance até o momento em que se deparou com 6,2% de queda em seu produto industrial. Pressionou incessantemente por mais renúncia fiscal e, não encontrando contrapartida no Estado encurralado pela queda de arrecadação, bradou a plenos pulmões que “não ia pagar o pato”. De fato, nunca pagou: dos 1,5 trilhão da Dívida Ativa da União, 62% estão na conta da parasitária e raquítica indústria brasileira. A Febraban, por sua vez, sempre manteve cordial relação com os governos petistas, afinal “nunca antes na história do país” os bancos ganharam tanto. No entanto, a despeito de todos os esforços e tapetes vermelhos estendidos pelo Partido dos Trabalhadores, a Federação nunca reconheceu o PT como sendo “um dos seus”, fazendo o possível para manter, durante estes 13 anos e meio, um estado permanente de iminente instabilidade econômica. Apontam, por sua natureza rentista, para o lado que acenar com a maior taxa de juros e maior grau de liberalização para a mobilidade de seus capitais, sem a menor cerimônia.
O cenário para a esquerda brasileira
A partir de hoje, mais do que nunca, o principal objetivo da esquerda é: enterrar as ilusões sobre a viabilidade do PT como partido de representação do clamor das maiorias populares. As coligações das eleições municipais ratificam, uma vez mais, que o PT é um partido da ordem burguesa: orienta-se pela lógica eleitoral e nada mais. Na medida do possível, buscará crescimento econômico com programas sociais que domestiquem a luta social. Assim como geriu a emersão dos mais pobres, não vacilará em retirar as conquistas sociais em nome dos interesses burgueses. A efemeridade da emancipação das classes populares é tamanha que não são necessários mais do que 6 meses para que as “inéditas conquistas sociais das administrações petistas” desapareçam como fome em banquete.
Notadamente, o segundo mandato de Dilma já se inaugurava com ataques aos direitos sociais. Basta recordar que em fins de 2014 e início de 2015, logo após garantir mais um ciclo eleitoral a presidente, que havia se comprometido em campanha que não tocaria nos direitos sociais “nem que a vaca tossisse”, prepara um ministério com o fino do pensamento conservador brasileiro e apresenta um pacote de maldades com a retirada de direitos trabalhistas e previdenciários[5]. A vaca, tuberculosa, veio acompanhada do maior contingenciamento orçamentário da História do país, da ordem de R$ 80 bilhões.
Como já era de se esperar, o contingenciamento só fez crescer a crise brasileira. O grande problema é que a gravidade da crise econômica não era mais compatível com o ritmo lento e vacilante do PT em fazer as reformas necessárias em favor da acumulação de capital. Dilma e o PT saem do governo, portanto, não por suas virtudes na execução das “políticas de inclusão social”; mas pelo esgotamento de sua capacidade de condução do projeto burguês do país.
Em sua ordem natural, o Partido dos Trabalhadores bradará o golpe aos quatro ventos e se colocará no papel de vítima. Seus líderes articularão a possibilidade de uma volta triunfal em 2018, na messiânica figura de Lula. Nós, que temos o compromisso com um mundo mais justo e igualitário, não podemos mais nos dar o direito de alimentarmos ilusões e otimismos ingênuos.
Enfim, não há tempo para viver o luto. Ainda que o mundo pareça ter desabado sobre muitos de nós hoje, acreditemos ou não, o sol nascerá amanhã e temos urgência em construir o novo. Diante do nítido esgotamento do sistema político brasileiro e sua incapacidade de se reinventar para apresentar alternativas viáveis às maiorias, a Revolução Brasileira torna a se apresentar não só como possibilidade, mas como necessidade premente. Ousemos: há vida na esquerda após o petismo.
[1]Disponível em: http://www.diariodocentrodomundo.com.br/de-a-aecio-a-z-zeze-perrella-a-f…
[2] Rememoro aqui o episódio da proposição de uma Assembleia Constituinte Exclusiva para a Reforma Política, emergida como a pauta mais avançada, de longe, da reação às manifestações de junho de 2013. Diante da ofensiva legalista dos “especialistas em Constituição”, a proposta se desmanchou no ar.
[3] Vide o Projeto de Lei Complementar 257/2016, que redefine os prazos e termos de pagamento da dívida dos Estados federados com a União; o Projeto de Emenda Constitucional 241/2016 que, entre outras coisas, congela por 20 anos o aumento real nas despesas primárias da União e a PEC 31/16, que desvincula 30% das receitas da União, estados e municípios.
[4] Eliseu Padilha, Romero Jucá, Geddel Vieira, Henrique Meirelles, Gilberto Kassab, Henrique Eduardo Alves e Gilberto Occhi
[5] Com a Medida Provisória 665, Dilma restringiu os acessos ao abono salarial, seguro-desemprego, seguro-defeso, pensão por morte e auxílio-doença.
Texto: IELA
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