El Senhor Galíndez como ‘romance de formação’ – a ‘escola de quadros’ da maquinaria de saqueio capitalista
Texto: André Queiroz
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O fechamento da RCTV
06/07/2007
Por Yarssan Dambrós – desde Mérida/Venezuela
A quase dois meses venho sobrevivendo na Venezuela de vender brigadeiros. Um doce que é tão trivial para qualquer brasileiro, na terra do melhor cacau do mundo é uma novidade que tem me dado algum dinheiro. Montei meu humilde negócio com uma cesta e um chapéu, na porta do restaurante universitário da Universidad de los Andes (ULA), em Mérida. Rodeada por montanhas nevadas, a cidade é conhecida por ser estudantil e turística, onde as aulas e as estações ditam o cotidiano e a economia.
Tudo ia bem, vendia e satisfazia com “los chocolaticos brasilenos”. Provocava aqueles que entravam a comer, pois sabia que a tentação os venceria diante da idéia de uma sobremesa daquelas. Já ganhava fama, no obstante, meu lucro caiu na semana que antecedia o fechamento do canal Radio Caracas de Televisão( RCTV). Alguém pode se perguntar o que é que tem uma coisa a ver com outra, mas acreditem, na Venezuela a política influencia e envolve a todos.
O fechamento vinha sendo anunciado à muito tempo para o dia 27/05/07. E a meia noite deste dia, depois de executado o hino nacional venezuelano, vimos cair o sinal do canal mais antigo deste país. Na semana que antecedia o
ocorrido, essa era a pauta das discussões nos corredores da universidade. Algumas manisfestações e panelaços antecipavam o que seguiria, com as aulas sendo suspensas frequentemente. Eu chegava a ULA para ganhar meu sustento e era impedido pela policia de passar para uma das ruas que davam acesso ao campus. A fumaça preta de pneus queimados me aclararam que os protestos haviam se intensificado.
Com a minha fonte de renda prejudicada e com uma tarde ociosa forçada , ia a casa de um amigo assistir TV. Passava a tarde vendo o tal canal quase fechado, para entender qual era o motivo de tamanha confusão. Fiquei sabendo que não somente na cidade onde eu estava, mas que também diversas universidades pelo país se manifestavam contra a decisão do governo. E toda aquela semana assim, pela manhã me frustava, pois os manifestantes não estavam muito interessados em doces e pela tarde acabava rendido ao teatro dos vampiros. Estranhei encontrar no tal canal muita semelhança com os grandes meios de comunicação brasileiros. Uma Xuxa morena, um Faustão magro, é claro que é diferente, mas depois de uma semana colado na telinha apreciei que mudava a forma, mas não o conteúdo.
Tentando compreender acabei me complicando ainda mais. Pela manhã escutava gritos fervorosos pedindo liberdade de expressão, pela tarde assistia libertinagem e alienação. Os conflitos ganharam vigor depois do fechamento e na manhã do dia 01/06 tivemos a notícia de que um policial ficou paraplégico pelo suposto disparo de um estudante, em meio aos protestos do dia anterior. As coisas pareciam invertidas, porque estudantes defendiam, com tanta veêmencia, um canal como a rede Globo.
Foi quando começou a circular a tese de um novo golpe de estado. Segundo os oficialistas (chavistas), essa era uma tentativa de criar um caos, desestabilizar a normalidade democrática e legitimar uma intervenção externa, com a velha desculpa da ditadura de Chávez. Tiraram suas camisetas vermelhas da gaveta e foram para a praça central da cidade escutar trova cubana e defender o seu processo. Mas o argumento dos fantasmas da CIA por todas as partes tampouco me conveceu.
O exagero era o factor comum dos dois discursos. Se o mundo era bombardeado pela grande mídia com a idéia de um conflito latente, entre vermelhos e azuis, ali bem perto, para o arco íris de ambulantes, operários, secretárias, bêbados e taxistas o cotidiano ainda imperava. No caso de uma rua fechada, davam a volta e seguiam o caminho da realidade. A guerra estava nas mesas de bares, depois de um dia de expediente. A fumaça dos pneus queimados subia e se perdia, rendida à beleza calma de “los Andes”.
Já na madrugada do dia 28/07, 20 minutos depois do fechamento da RCTV,
começou a transmissao do novo canal Televisora Venezuelana Social( TVes ). Foi construído com incrível rápidez, função para qual se fez um chamado à artistas de todo o país, jornalistas e especialistas, inclusive ex integrantes do defunto canal. A maior parte do financiamento da novidade vem do governo venezuelano, mas evitam caracterizar-lo como estatal, sendo mais
corrente a conceito de canal de serviço público. A proposta afirma que esse não deve ser burocratizado e regido pelo estado exclusivamente. A idéia é que seja um espaço de difusão dos trabalhos de produtores independentes e televisões comunitárias, que teriam responsabilidade inclusive sobre a programaçao. A nova estaçao é presidida pela jornalista Lil Rodríguez, conhecida pelo seu trabalho na promoção da cultura popular e da música afroamericana.
De um lado ao outro da cidade seguia caminhado, com o bolso já quase vazio, mas a cabeça transbordando. Pela manhã, pensava se não seria melhor deixar um pouco de lado conceitos já tão corrompidos como a liberdade de expressão e comércio, para gritar pela oportunidade de expressar-se e de trabalhar. A crise na universidade não passava e já andava jantando brigadeiro.
Pela tarde, com todas aquelas guloseimas quase derretidas, via o fervor de alguns chavistas ao defender seu presidente. Notava um processo extremadamente dependente do seu líder, em um país que ainda é totalmente
dependente do sangue negro da terra, mais conhecido como petróleo. Sangue esse que alimenta vampiros que já conhecemos de antigos contos. Vejo um país constantemente caluniado pela mídia internacional e envolvido em uma guerra propagandística. Obrigado a defender sua convicção com as mesmas armas, mas que devido a isso pode se perder em um círculo vicioso de um aparato de estado construido e usado para assegurar a oficialidade, perdendo o seu sul que deve ser o impulso do poder comunitário.
Depois de aproximadamente duas semanas de protestos e pindaíba, a universidade voltou a ter aulas e com elas a garantia do meu pão de cada dia. Voltei a vender tão bem, que ontem tive chance de passar a tarde assistindo o novo canal. Passaram um documentário interessante, que se não me falha a memória se chama “La revolución no será televisionada”.
Talvez eu deveria estar preocupoado
Com a fome no mundo,
Com o fim do universo.
Ou buscar meu lugar no tal mercado,
Deixar de ser Vagab(m)undo
Pôr cimento no meu verso.
Poderia imaginar a guerra de cada dia,
Dentro de um quarto, por uma janela de utopia.
E se eu comprasse uma televisão?
Tudo passando e eu sentado,
Gozando qualquer ilusão.
Yarssan Dambrós, 21 anos, caminhante.
Texto: André Queiroz
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Texto: Rafael Cuevas Molina - Presidente AUNA-Costa Rica