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As eleições do poder judiciário no México

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Por Carlos Figueroa Ibarra em 09 de junho de 2025

As eleições do poder judiciário no México

Foto: AP/Marco Ugarte

Não compartilho da desqualificação que foi feita da eleição do poder judiciário desde a direita e de outros setores da oposição. Aqueles que assim opinam parecem esquecer a corrupção, o nepotismo, o classismo e o racismo que caracterizaram até agora o poder judiciário.

Escrevo estas linhas depois de ter exercido, junto com minha família, o voto para as eleições do poder judiciário. Mesmo sabendo que a afluência à urna que nos correspondia não seria muito numerosa, decidimos ir cedo, pois imaginamos que o exercício do voto seria demorado devido à complexidade da marcação dos boletins. Na esquina da minha rua, o vigilante me perguntou: “vizinho, você vai votar?”. Ao responder positivamente, ele me indicou que a urna estava exatamente na rua onde moro, a cerca de quinhentos metros. Ao atravessar a rua, uma vizinha gritou de calçada a calçada: “Mestre Carlos, você vai votar?”. Respondi afirmativamente e ela me deu claras indicações do endereço particular onde foi instalado o centro de votação. Perguntei-me se o interesse mostrado pelo vigilante e pela minha vizinha augurava um interesse generalizado pelo evento histórico de, pela primeira vez, eleger o poder judiciário no México.

Mas eu era cético quanto ao percentual que votaria da lista nominal de quase cem milhões de eleitores. No final, 13 milhões de mexicanos foram votar por um novo poder judiciário. Isso corresponde a 13% da lista nominal de eleitores e 22% dos 60 milhões que votaram nas eleições presidenciais de 2024. Três milhões de votos a mais do que os que o PAN obteve e 6,4 milhões a mais do que o PRI. Treze milhões de mexicanos me parece um bom número se considerarmos a dificuldade do preenchimento dos boletins, o fato de ser a primeira vez que ocorre uma eleição judicial, que foram instaladas apenas 50% das urnas que foram colocadas em junho de 2024 e que não se pode comparar uma eleição desse tipo com as eleições presidenciais.

A eleição do poder judiciário foi uma na qual foi difícil exercer o voto. As anunciadas seis boletas de cores diferentes e múltiplas opções foram entregues pelos cidadãos que aceitaram a tarefa cívica de serem mesários, que totalizaram 775.525 em todo o país, distribuídos nas quase 84.000 urnas instaladas no território nacional. Foram distribuídas quase 682 milhões de boletins eleitorais em todo o país. Neste domingo, 1º de junho, os mexicanos escolheram 881 juízes entre 3.397 candidaturas. O Instituto Nacional Eleitoral (INE) decidiu proibir a distribuição de “cola” (listas com número e nome dos candidatos a juízes), mas não proibiu que os eleitores as levassem consigo para poder exercer o voto. Alguns comentaristas da oposição criticaram que não foi proibido que os eleitores levassem tais listas como lembrete. Parece-me absurdo; é impossível votar de memória para uma grande quantidade de cargos da Suprema Corte de Justiça, do Tribunal de Disciplina Judicial, da Sala Superior do Tribunal Eleitoral do Poder Judiciário da Federação (TEPJF), das Salas Regionais do referido TEPJF, juízes de Circuito Judicial e juízes de Distrito Judicial, aproximadamente 29 cargos, segundo os cálculos que fiz. Em algumas entidades do país, esse número aumentou devido à eleição de juízes a nível estadual.

Através de minhas amizades e conhecidos que me forneceram informações, bem como da que consegui por conta própria, pude confeccionar uma lista de candidatos que me pareceram ter representatividade em relação ao que se buscou com a reforma judicial e o que se busca com estas eleições: que o cargo de juízes seja exercido por pessoas que têm empatia pelos mais vulneráveis e que, independentemente de sua ideologia, tenham na honestidade seu traço essencial. Duvido muito que a grande maioria dos eleitores tenha feito uma longa pesquisa nos currículos disponíveis dos candidatos no site do INE. A maioria dos eleitores se dirigiu a pessoas que supunham informadas para que lhes indicassem por quem votar. Aqueles que fizeram essas consultas também tinham em mente alguns candidatos que são conhecidos por sua exposição na mídia.

Isso foi particularmente verdadeiro no que diz respeito às candidaturas a ministros da Suprema Corte de Justiça. Mas as campanhas eleitorais dos 3.397 candidatos se diluíram na maré de informações que recebemos diariamente. Assim, familiares, amigos e colegas se dirigiram a mim para perguntar sobre minhas preferências para os cargos a serem escolhidos. E com prazer as compartilhei e imagino que fizeram o que minha família e eu fizemos: ir à urna com uma lista de candidaturas confiáveis em um papel ou no celular. Isso foi o que vi na urna onde votei: eleitores (boa parte deles da terceira idade) exercendo cuidadosamente o sufrágio com a ajuda de sua lista.

É muito provável que, neste processo eleitoral, os grandes poderes locais tenham confeccionado “colas” e as distribuído para influenciar o voto da cidadania. Pouco antes de sair de casa, vi um vídeo em que se afirma que Silvia Tanús, a ex-priísta agora secretária de Mobilidade e Transporte do governo em Puebla de Alejandro Armenta, tem entre as candidaturas a juízes seu filho, sua nora, o chefe dela e sua afilhada. O vídeo também afirma que tais candidaturas estão sendo apoiadas pelo governador. Ignoro se essa informação é verdadeira, mas se for, talvez não seja o único caso. Não se pode negar que a Quarta Transformação avança cheia de integrantes e práticas da classe política do antigo regime, fato agravado pela migração de antigos priístas e panistas para o Morena e para os governos oriundos desse partido.

No entanto, não compartilho da desqualificação que foi feita da eleição do poder judiciário desde a direita e de outros setores da oposição. Aqueles que assim opinam parecem esquecer a corrupção, o nepotismo, o classismo e o racismo que caracterizaram até agora o poder judiciário. É falso dizer que o poder judiciário que emanará deste processo eleitoral, que envolveu milhões de pessoas, será pior do que aquele que surgia do influentismo e das relações de parentesco de alguns poucos. Dizer que escolher juízes é tão absurdo quanto escolher por voto qual médico irá tratar sua doença é uma falácia que ignora que as candidaturas puderam ser possíveis após um longo processo de seleção meritocrática. Afirmar que, por meio deste processo eleitoral, o narcotráfico ou o governo determinarão quem serão ministros, magistrados, juízes e juízas é ignorar o poder dos milhões de pessoas que foram às urnas.

Afirmar que esta eleição foi uma eleição de Estado e consolidará o caminho do México rumo a um regime autoritário é ignorar que a mesma significa a incorporação do povo, do demos, na designação do poder judiciário, da mesma forma que foi feito com o poder executivo e legislativo. Eis aqui, ao contrário da tese da deriva autoritária no México, o grande conteúdo democratizador do que vivemos no domingo, 1º de junho.

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