Regime de Nayib Bukele força 40 jornalistas ao exílio.
Texto: Resumen Latinoamericano/ Prensa Comunitária
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Desenho de Estuardo de Paz
Nas últimas semanas, pelo menos 40 jornalistas fugiram de seu país em busca de refúgio após serem vítimas de ameaças e vigilância por agentes do Estado sob o comando de Nayib Bukele, informou a Associação de Jornalistas de El Salvador (APES).
A Associação de Jornalistas de El Salvador (APES) registrou o deslocamento forçado de pelo menos 40 jornalistas nos últimos meses, com o maior número ocorrendo nas últimas semanas. Os principais motivos foram “assédio, intimidação e restrições arbitrárias” ao seu trabalho jornalístico por agentes ou funcionários do Estado salvadorenho.
Do total de jornalistas salvadorenhos deslocados, pelo menos 16 — de quatro veículos digitais e um impresso — deixaram o país entre maio e junho deste ano, segundo registros da APES.
A maioria trabalhava para veículos de comunicação independentes e investigava casos de corrupção, violações de direitos humanos, execuções extrajudiciais durante o estado de emergência, degradação ambiental por incorporadoras imobiliárias e ligações entre autoridades e grupos criminosos. “Esses jornalistas de diversos veículos realizaram um trabalho relevante sobre violações de direitos humanos, transparência e outras questões”, afirmou a associação em um comunicado recente.
Um dos afetados é Víctor Peña, fotojornalista e produtor do El Faro, que teve que deixar o país no início de maio após saber, extraoficialmente, que a Procuradoria-Geral da República (FGR) estava se preparando para prender sete jornalistas daquele veículo digital. O alerta veio depois que o El Faro começou a publicar uma série de vídeos nos quais dois líderes de gangues afirmam que havia um acordo entre o então candidato à presidência Nayib Bukele e estruturas de gangues.
Segundo os depoimentos, as gangues foram instruídas a pressionar e ameaçar a população para que votasse nele nas eleições presidenciais de 2019. Nessas eleições, nas quais participaram apenas 51% dos eleitores registrados, Bukele foi eleito presidente da República com 53% dos votos válidos. “Eu havia decidido ficar, mas várias fontes nos alertaram que a Procuradoria-Geral da República estava construindo um caso. Eles mencionaram sete mandados de prisão contra membros do jornal. Quando você entende isso, você diz: Bem, isso tem uma conexão com as sete pessoas que trabalharam nesta publicação”, diz Peña. O fotojornalista partiu por terra com dois colegas no início de maio, levando parte de seu equipamento fotográfico e roupas em algumas malas. Sua esposa e filha também tiveram que deixar El Salvador por medo de represálias. Elas deixaram para trás sua casa, pertences, sonhos e a vida em comum. “Tínhamos uma vida normal como qualquer outra pessoa, mas essa situação acabou nos tirando tudo. Agora vivemos nossas vidas divididos em quatro malas”, lamenta.
Silêncio do Estado
A APES denunciou o suposto plano de prisão dos jornalistas do meio digital El Faro, mas, apesar disso, o governo salvadorenho não se pronunciou até o momento sobre os mandados de prisão e as alegações de perseguição. Em 6 de maio, advogados da Clínica Jurídica da associação solicitaram informações oficiais e detalhadas ao Ministério Público salvadorenho sobre a suposta investigação contra os jornalistas do El Faro, mas também não receberam resposta. “Estamos exercendo o direito dos jornalistas de saber se há alguma acusação criminal ou investigação contra eles”, declarou o advogado da APES, Oswaldo Feusier, naquele dia. Ele acrescentou que a investigação jornalística, o direito de informar e a liberdade de expressão não podem e não devem ser criminalizados.
Sergio Arauz, presidente da APES, afirma que até o momento não se sabe de quais crimes os jornalistas estão sendo acusados em juízo. A única informação que se sabe baseia-se em informações divulgadas publicamente por Peter Dumas, diretor da Agência Estatal de Inteligência (OIE). O funcionário já declarou publicamente em outras ocasiões, em sua conta no X: “Com ‘jornalistas’ financiados e vinculados a gangues, tráfico de drogas, abuso sexual, tráfico de pessoas e outros crimes, deveríamos ter o dobro do orçamento. Eles não podem se esconder para sempre atrás do privilégio invisível do ‘jornalismo’.”
O presidente da APES acrescenta que a falta de informação por parte das autoridades aumenta a incerteza e a ansiedade dos jornalistas que desconhecem seu status legal, o que dificulta a decisão de retornar ao país. “Eles estão em uma situação de incerteza porque ninguém tem certeza sobre seu futuro próximo. Pessoas que deixaram suas casas, em muitos casos sem saber por quanto tempo ficariam fora”, diz Arauz.
Perseguição a vozes dissidentes aumenta
Em separado, Arauz confirma que nos últimos dias houve um aumento significativo nos relatos de “situações anômalas”, que criam um clima de medo generalizado. Entre elas, ele menciona vigilância, monitoramento, perfilamento e ameaças contra jornalistas, em muitos casos por agentes e funcionários do Estado.
“Há relatos de policiais tirando fotos de jornalistas, policiais do lado de fora de suas casas, interrogatórios de familiares de jornalistas e relatos concretos e confiáveis de mandados de prisão, particularmente contra jornalistas de El Faro”, explica Arauz.
Para o presidente da APES, esses casos não são isolados; ao contrário, os recentes deslocamentos ocorrem em um contexto de “uma escalada autoritária” em que advogados, defensores de direitos humanos e líderes comunitários também estão sendo criminalizados por exercerem seu direito à liberdade de expressão e protesto.
Nos últimos meses, autoridades salvadorenhas prenderam críticos do governo como parte do estado de emergência que, nos últimos três anos, restringiu as garantias constitucionais de toda a população.
Em 12 de maio, o pastor da Igreja Elim, José Ángel Pérez, foi preso durante um protesto próximo à residência do presidente Bukele. Um dia depois, o advogado e defensor ambiental Alejandro Henríquez foi preso em conexão com o mesmo protesto. Ambos foram acusados de desordem pública e resistência à prisão.
A advogada e chefe da unidade anticorrupção do Cristosal, Ruth Eleonora López, foi presa em 18 de maio por ordem do Ministério Público salvadorenho. Ela foi inicialmente citada nas redes sociais da instituição por peculato, mas em juízo foi acusada de enriquecimento ilícito durante sua gestão como assessora do ex-presidente do Tribunal Supremo Eleitoral (TSE), Eugenio Chicas.
Duas semanas depois, em 7 de junho, o advogado constitucionalista e colunista do El Diario de Hoy, Salvador Enrique Anaya, foi preso e acusado de lavagem de dinheiro.
O Ministério Público afirma que os presos estão envolvidos em diversos crimes, mas organizações nacionais e internacionais alertam que esse é um padrão de criminalização contra vozes dissidentes, jornalistas e defensores dos direitos humanos.
Uma Vida Interrompida
Embora casos de deslocamento de jornalistas tenham vindo à tona nas últimas semanas, os primeiros êxodos por medo de represálias foram registrados no ano passado.
Um deles é o de Carolina Amaya, diretora do veículo digital Malayerba, especializado em jornalismo investigativo ambiental, que está no exterior há mais de um ano.
Do exterior, a jornalista compartilha como é difícil deixar o país para ir para outro onde falta emprego, família e estabilidade social. “Tomar a decisão de partir é muito difícil; te transforma completamente. Me faz rir quando as pessoas dizem que estamos apenas buscando o exílio. Elas realmente não sabem o que significa começar do zero em um novo país, sem redes, sem emprego, sem estabilidade”, lamenta.
Carolina deixou El Salvador em 15 de maio de 2024, após seu pai, Benjamín Amaya, ser libertado depois de dez meses na prisão, acusado pelo Ministério Público de fazer ameaças.
Poucos meses antes de sua prisão, o pai da jornalista e outros agricultores foram ameaçados por funcionários de uma empresa de energia solar para que os obrigassem a deixar terras estatais, que os agricultores usavam há vários anos para cultivar milho, feijão, hortaliças e algumas frutas.
Após a libertação do pai, a jornalista viajou para a Espanha com uma bolsa de estudos, mas, enquanto estava fora, foi processada por uma construtora depois que Malayerba publicou uma investigação sobre a destruição ambiental de uma área protegida no Lago Coatepeque, no oeste do país. “Foi naquele momento que eu soube que tudo ia piorar. Qual o sentido de continuar em um país onde, ao fazer pesquisas ambientais e tocar em interesses econômicos e políticos, você fica mais vulnerável?”, reflete.
Aumento de Ataques
O último relatório da APES sobre liberdade de imprensa revela um aumento alarmante de 154% nos ataques a jornalistas em 2024, em comparação com o ano anterior.
De acordo com o documento, 311 denúncias foram registradas em 2023, enquanto em 2024 o número subiu para 789. Destas, 70% foram supostamente cometidas por funcionários públicos, funcionários públicos, instituições estatais, forças de segurança e indivíduos que exercem funções estatais.
Entre os ataques mais frequentes estão as restrições ao exercício do jornalismo, declarações estigmatizantes, que se agravam quando as vítimas são mulheres, e o bloqueio do acesso à informação.
A associação documenta ataques contra jornalistas desde 2018, incluindo a prisão do comunicador comunitário Víctor Barahona. Barahona foi preso em sua residência no norte de San Salvador em 7 de junho de 2022 e posteriormente acusado de associação criminosa, um crime relacionado a gangues. Após ser libertado após passar 11 meses na prisão, Barahona, com o apoio da APES, denunciou sua detenção como arbitrária. Em dezembro do ano passado, ele foi admitido na Relatoria Especial das Nações Unidas (ONU) sobre a Situação dos Defensores dos Direitos Humanos. Em nota, a APES afirma que “o objetivo da denúncia é conscientizar o caso e solicitar medidas protetivas específicas para garantir a proteção integral do jornalista”. Como ele está em liberdade sob medidas alternativas à prisão, seu caso permanece em aberto.
Lei da Mordaça
A APES destaca que a situação de censura e hostilidade se agrava com a Lei de Agentes Estrangeiros, recentemente aprovada pela Assembleia Legislativa, que impõe um imposto de 30% sobre qualquer transferência, doação ou pagamento do exterior a organizações ou indivíduos que trabalhem com financiamento internacional.
Em comunicado, a Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP) alerta que essa legislação “representa uma ameaça direta à liberdade de imprensa e ao trabalho de organizações independentes”.
Para a APES, trata-se de mais uma medida para criminalizar a profissão jornalística e, diante dessa situação, exige do governo salvadorenho garantias que permitam aos jornalistas exercerem seu trabalho sem medo de serem criminalizados e processados por exercerem suas funções. “Pedimos que cessem a repressão e o abuso de poder e que abram um diálogo real para a restauração de direitos”, conclui a presidente da APES.
Texto: Resumen Latinoamericano/ Prensa Comunitária
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