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Em El Salvador se aprofunda o autoritarismo

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Por Elaine Tavares em 06 de agosto de 2025

Em El Salvador se aprofunda o autoritarismo

Cárceres em El Salvador  – Foto: The New York Times

El Salvador, país da América Central que vem sendo citado por vários presidentes latino-americanos como um modelo no quesito segurança, vai mostrando que a paz por lá é mesmo a de cemitério. Tudo parece estar bem porque a mão que governa é dura. Nayib Bukele, que está no seu segundo mandato, decidiu encarcerar um grande número de pessoas na missão de acabar com a ação das “maras”, grupos de delinquentes que assolavam o país. Durante seu primeiro mandato construiu prisões e jogou na cadeia milhares de pessoas supostamente ligadas ao crime. A população reagiu agradecida, pois era bastante difícil viver com a ação dos bandos criminosos. Mas, com o passar do tempo foram pipocando denúncias de que não apenas os jovens ligados às maras estavam indo parar na prisão. Desafetos, jornalistas, defensores dos direitos humanos e opositores também começaram a ser presos de maneira autoritária. Não bastasse isso, o governo ainda ofereceu seus cárceres para receber prisioneiros estadunidenses, virando assim um negociante de pessoas.

Migrantes venezuelanos enviados para El Salvador desde os Estados Unidos, ao serem libertados pelo governo da Venezuela, em negociação direta com os EUA, denunciaram as horríveis torturas que viveram enquanto estiveram nos cárceres salvadorenhos. Ainda assim, o mundo faz vista grossa e seguem chegando levas de gente que são presas nos Estados Unidos pelo simples fato de serem migrantes. Bukele se faz cúmplice, então, da repugnante campanha de Donald Trump contra os migrantes latinos, deportados aos milhares.

Agora, no último dia do mês de julho, conseguiu aprovar na Assembleia Nacional, que é completamente dominada por seus apoiadores, uma mudança constitucional que garante reeleição indefinida, aumenta para seis anos o mandato presidencial e simplesmente acaba com o segundo turno nas eleições. Segundo ele é uma modernização necessária no sistema político. Até aí seria o jogo democrático não fosse o fato de que a reforma constitucional aprovou e ratificou as mudanças em um único dia, sem que o tema passasse por qualquer discussão interna ou pública.

Entidades ligadas aos direitos humanos tem feito a denúncia sobre o rumo autoritário que o governo tomou e que vem se aprofundando já que a modificação das regras parece só beneficiar ao próprio presidente. A Corte Interamericana de Direitos Humanos critica a reeleição indefinida alegando que viola o princípio da alternância de poder. Na verdade, esse é o menor dos problemas, afinal, um governante pode ter a aprovação popular por longos anos. Já vimos isso acontecer em países como França e Alemanha. O que torna a coisa autoritária é a forma como o processo de mudança aconteceu, sem qualquer discussão pública. Opositores de Bukele afirmam que seu desejo de permanecer no poder tem a ver com os acordos espúrios que tem feito, evitando assim futuras investigações.

O partido de Bukele, Nuevas Ideas, que tem o apoio do PCN e PDC, deu como justificativa para aprovar o fim do segundo turno o fato de que o processo em dois turnos é muito caro. Mas, para a oposição, o motivo é outro. A intenção é garantir que se rebaixe ainda mais o número de votos necessários para eleger alguém. A proposta aprovada reduz o período presidencial iniciado em 2024, que iria até 2029. Será feita uma nova eleição, antecipada, em primeiro de junho de 2027 – na metade do segundo mandato – para unificar com as demais eleições gerais, de assembleístas nacionais e conselheiros municipais. Como já estará valendo o turno único, quem fizer o maior número de votos, leva.

O fato é que o autoritarismo de Bukele só cresce, desde a tomada da Assembleia comandada por ele e o Exército em 2020. Naquele então foi fechada a Sala Constitucional e deposto o fiscal geral da República. O roteiro perfeito do manual do ditador. Mas, para a opinião pública o discurso passado é outro.

O jornal El Faro, de El Salvador, mostra como se dá esse “consenso nacional” com a avassaladora presença do presidente nos meios de comunicação, sempre com mensagens positivas por parte da imprensa. Uma jornalista acompanhou as notícias na televisão durante cinco dias e o que viu foi um país em transformação: ruas asfaltadas, escolas remodeladas, bandidos capturados e cidadãos agradecidos. No centro de tudo, Bukele. “Encontramos 782 referências a ele. Numa só edição noturna ele foi mencionado 168 vezes durante uma transmissão de duas horas. Isso equivale a uma menção de Bukele a cada 43 segundos”.

Nesse cenário, fica bem difícil para a oposição enfrentar o governo nas eleições de 2027.

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