História e Pensamento Militar
Texto: IELA
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A visita do “mister”
21/03/2007
Por Nildo Ouriques – Presidente do IELA/UFSC
A visita do presidente dos Estados Unidos a alguns países da América Latina representou mais uma oportunidade para tornar o imperialismo invisível entre os latino-americanos e especialmente entre nós, os brasileiros. Mesmo diante de tanto protesto de rua, manifestação de repúdio nos parlamentos, críticas de certos setores da grande imprensa, proliferaram também artigos e entrevistas em que alguns autores saudavam a “virada” da política externa da principal potência capitalista em relação à América Latina. Na maioria dos casos, se insistiu sobre o fato de que finalmente os Estados Unidos estariam despertando de seu pesadelo propiciado pela invasão no Iraque e estariam se interessando novamente pelos destinos da região.
Subjacente a esta hipótese, esta idéia de que os Estados Unidos se desinteressaram pela América Latina nas décadas passadas, como se, premido pelo esforço político e econômico desprendido com a ofensiva imperialista no Oriente Médio, não lhes restasse forças para cuidar de seu tradicional “pátio traseiro”. Segundo esta mesma hipótese, a erupção de governos nacional-populares que terminaram por inclinar o pêndulo latino-americano para a esquerda, especialmente depois da eleição de presidentes como Hugo Chávez, Evo Morales e Rafael Correa, foi produto do “descuido” da política externa estadunidense, particularmente desastrosa durante os dois governos republicanos.
Mais que uma hipótese, estamos diante de uma impostura intelectual destinada a tornar a ação imperialista no continente praticamente invisível. Acaso os Estados Unidos realmente abandonaram na última década os latino-americanos?
A política econômica aplicada sem dó nem piedade na absoluta maioria dos países da região se denominou, segundo a esquerda liberal, de “neoliberalismo”. Esta política, como sabemos, emanava do famoso “Consenso de Washington” e era inspirada, aplicada e fiscalizada pelo FMI e o Banco Mundial, organismos em que os Estados Unidos possuem profunda influência. O resultado desta orientação de política econômica foi o empobrecimento de 62% da população do continente atualmente composta por pobres e miseráveis.
A deposição do presidente Aristide no Haiti, a tentativa de golpe contra o presidente Hugo Chávez na Venezuela, o apoio incondicional em termos financeiros e militares para manter o terrorismo de estado na Colômbia, o bloqueio à Cuba, o exílio dourado a presidentes depostos como Sánchez de Losada na Bolívia, a pressão em todos os terrenos contra as rebeliões populares da qual Equador em 2001 é o maior exemplo, acaso constituem momentos de uma política de “abandono” do pátio traseiro? Poderíamos continuar com uma espécie de pequeno conto das intervenções estadunidenses no terreno da política e agregar outras tantos na cultura, diplomacia, etc.
É óbvio que a política externa estadunidense chegou a seus limites. Mas é preciso cautela para superar o horizonte liberal na interpretação sobre o ponto, pois se a política externa da potencia em crise já não dá conta de manter a hegemonia em escala global como considero, há uma clara tentativa de mudar a retórica sem, contudo, mudar a essência. Ocorre que a crise de hegemonia é precisamente isso: os Estados Unidos já não podem ganhar a guerra no Iraque e tampouco podem simplesmente sair de lá sem sérias implicações para sua política externa e para o controle mundial que pretendem.
Mas é preciso observar que se conservadores da ultra-direita como Francis Fukuyama estão abandonando o antigo radicalismo que caracterizou suas preposições na política externa estadunidense, é verdade que não o fazem para entrar em campanha mundial para dar o premio Nobel da Paz a Madre Tereza de Calcutá. Estão apenas tentando outra modalidade de controle, de dominação. Buscam recomposição com ex-aliados e especialmente a construção de contrapesos ao nacionalismo revolucionário em curso no continente.
Como anunciou o General James Hill, chefe do Comando Sul dos Estados Unidos, a ameaça aos interesses nacionais estadunidenses na região esta ameaçado pela erupção do “populismo radical”, a nova versão do velho fenômeno político latino-americano encabeçado por líderes mais decididos e fieis aos interesses populares que navegam na onda propiciada pelo fracasso da modernização capitalista que prometeu mundos e fundos às maiorias e criou a maior taxa de desemprego de nossa história recente, uma impressionante onda migratória e o super-endividamento do estado, pela via interna e externa. Enfim, a criação de uma economia exportadora cuja tendência não é outra que o agravamento da crise social e a perpetuação da dependência..
O roteiro do presidente dos Estados Unidos foi, não obstante, bem escolhido. Nestas circunstâncias, foi um grave erro da diplomacia brasileira recebê-lo. A impossibilidade de uma política externa efetivamente independente e soberana é produto da política econômica em curso, razão pela qual nos resta apenas o triste papel do exercício da subserviência e da boa vizinhança com o algoz das experiências populares que apenas começam em outros países da América Latina.
Texto: IELA
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