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Caso Assange: testemunha-chave admite ter mentido em troca de imunidade

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Por IELA em 30 de junho de 2021

Caso Assange: testemunha-chave admite ter mentido em troca de imunidade

Assange and Thordarson Foto: Mynd Sansett/Stundin

Uma das principais testemunhas no caso de extradição de Julian Assange admitiu que fez falsas alegações contra Assange em troca de imunidade a acusações, uma revelação bombástica que pode ter um grande impacto no destino do fundador do WikiLeaks.
Assange pode pegar até 175 anos de prisão se for levado aos Estados Unidos, onde foi indiciado por violações da Lei de Espionagem relacionadas à publicação de documentos confidenciais expondo crimes de guerra norte-americanos.
De acordo com um novo artigo no jornal islandês Stundin, o hacker condenado Sigurdur “Siggi” Thordarson falsamente alegou que era um representante proeminente do WikiLeaks, instruído por Assange a realizar ataques de hackers, mas na verdade ele estava apenas tangencialmente envolvido com a organização.
O artigo sugere que o Departamento de Justiça dos EUA trabalhou em conjunto com Thordarson para forjar a acusação contra Assange que foi submetida aos tribunais britânicos.
“Esta é apenas mais uma, a mais recente, revelação para demonstrar por que o caso dos EUA contra Assange deve ser encerrado”, disse Jennifer Robinson, advogada de direitos humanos que assessora Assange e o WikiLeaks desde 2010. “A base factual para este caso desmoronou completamente.”
Amy Goodman: Abordamos agora um grande acontecimento no caso do fundador do WikiLeaks, Julian Assange, que o Departamento de Estado dos EUA está pressionando para extraditar da Grã-Bretanha. Assange pode pegar até 175 anos de prisão se for trazido aos Estados Unidos, onde foi indiciado por violações da Lei de Espionagem, relacionadas à publicação de documentos confidenciais expondo crimes de guerra norte-americanos.
Agora, uma das principais testemunhas nesse caso de extradição admite que fez falsas alegações contra Assange em troca de imunidade a acusações. A revelação veio em uma entrevista com o hacker islandês “Siggi” Thordarson, para um artigo detalhado publicado pelo jornal quinzenal islandês Stundin. O artigo sugere que o Departamento de Justiça dos EUA trabalhou com Thordarson para fabricar a acusação contra Assange que foi submetida aos tribunais britânicos.
Os promotores dos EUA entraram com uma acusação substitutiva contra Assange, em junho de 2020, que se refere a Thordarson como um “adolescente” e à Islândia como “País 1 da OTAN” e diz que Assange o encorajou a, entre outras coisas, “cometer invasão de computador” e roubar gravações de áudio de conversas telefônicas entre autoridades islandesas.
O artigo do jornal Stundin cita documentos inéditos e registros de bate-papo que mostram como Thordarson falsamente se apresentou como um representante proeminente do WikiLeaks. O jornal relata que, na verdade, “todas as indicações são de que Thordarson estava agindo sozinho sem qualquer autorização, sem mesmo qualquer influência, de qualquer pessoa dentro do WikiLeaks”.
Para mais informações, juntamo-nos a Jennifer Robinson, advogada de direitos humanos que assessora Julian Assange e o WikiLeaks desde 2010. Ela, como Julian Assange, é cidadã australiana. Ela se junta a nós da Austrália Ocidental.
Bem-vinda de volta ao Democracy Now!, Jen. Você pode explicar o significado desta última revelação e o que deve significar, em sua opinião, para Julian Assange?
Jennifer Robinson: Esta é apenas mais uma evidência de quão problemático é o caso dos Estados Unidos contra Julian Assange – e, de fato, um caso infundado. Claro, como você explicou na introdução, foi demonstrado que a prova que Thordarson deu aos Estados Unidos, e que formou a base da segunda acusação, incluindo alegações de hacking, foi inventada, como ele próprio admitiu.
Ele não só deturpou o acesso que tinha a Julian Assange e ao WikiLeaks e sua associação com Julian Assange, como agora reconheceu que inventou e falsamente distorceu os fatos apresentados aos Estados Unidos de que havia qualquer associação com o WikiLeaks e qualquer associação com hackers.
Então, esta é apenas a mais recente revelação a demonstrar por que o caso dos EUA deve ser encerrado. Temos que começar, é claro, com as implicações para a liberdade de expressão. Grupos de liberdade de expressão, The Washington Post, New York Times, a grande mídia são unanimemente contra e denunciaram esta acusação como uma ameaça à liberdade de expressão nos Estados Unidos. Mas deixando isso de lado, a base factual para este caso desmoronou completamente. Há muito tempo, temos pedido que este caso seja retirado. Esta é apenas mais uma forma de abuso demonstrada nesta acusação, que prova por que ela deve ser retirada.
Amy Goodman: Jen Robinson, quais razões, em sua opinião, teriam levado Thordarson a fazer essas revelações agora? Ele não só concedeu esta entrevista exclusiva ao jornal islandês Stundin, mas também entregou registros de bate-papo nunca publicados antes e novos documentos de seu tempo como voluntário do WikiLeaks. Por favor, fale, também, sobre a real proeminência de Thordarson dentro da organização, ou falta dela.
Jennifer Robinson: Só posso especular sobre a razão de ele ter escolhido vir a público agora. Mas, claro, como você sabe, em janeiro, ganhamos a luta de extradição. A juíza decidiu recusar a extradição de Julian Assange para os Estados Unidos – infelizmente, não por motivos de liberdade de expressão, mas por razões humanitárias associadas à sua saúde mental e às condições opressivas de prisão que enfrentaria se voltasse para os Estados Unidos. Os Estados Unidos, sob o governo Trump, tentaram recorrer dessa decisão, e ainda estamos aguardando uma decisão do tribunal britânico se a permissão para recorrer será concedida. Enquanto aguarda essa decisão, Julian permanece na prisão no Reino Unido.
Então, essa é apenas mais uma indicação – temos pedido que este caso seja encerrado. Pedimos ao governo Biden que retire o recurso e permita que Julian volte para casa, para sua família. Eu acho que esta última revelação só contribuirá para esse apelo à administração Biden para pôr fim a este caso. Talvez sua motivação fosse outra, mas é difícil dizer.
Amy Goodman: Você poderia falar sobre funcionários islandeses que agora estão aparentemente afirmando que o governo dos EUA está “tentando usar as coisas aqui [na Islândia] e usar as pessoas em nosso país para girar uma teia de aranha, uma teia de aranha que pegaria Julian Assange”? O artigo também relata que o governo dos EUA essencialmente enganou funcionários islandeses.
Jennifer Robinson: Mais uma vez, isso está demonstrando o abuso significativo e problemático que vimos ao longo deste caso. Não só estamos olhando para a coleta de evidências problemáticas dentro da Islândia, cuja legalidade tem sido questionada pelas autoridades islandesas; vamos olhar para as outras formas de abuso que vimos neste caso.
Como fizemos na audiência de extradição, agora sabemos que Julian foi ilegalmente espionado, as consultas com seu médico foram espionadas ilegalmente, nós, como sua equipe jurídica, fomos espionados ilegalmente. Ele teve material com privacidade legalmente protegida apreendido pelo governo dos Estados Unidos.
Como Daniel Ellsberg disse em seu testemunho perante o tribunal de extradição no Reino Unido, esse tipo de conduta abusiva dos Estados Unidos foi suficiente durante o governo Nixon para que todo o caso contra Daniel Ellsberg fosse rejeitado por abuso de processo. Mas em 2021, estamos vendo espionagem ilegal, apreensão de material legalmente resguardado, e agora uma fonte que admite que forjou provas e mentiu para o FBI e para os Estados Unidos sobre as evidências nas quais esta acusação se baseia. Isso deve ser mais do que suficiente para os Estados Unidos e para a administração Biden porem fim a este caso. Já passou muito da hora de fazê-lo.
Amy Goodman: Você também tem essa situação em que Siggi Thordarson foi condenado por abuso sexual de menores e outros crimes, incluindo fraude financeira. Na entrevista, ele admitiu ter continuado sua onda de crimes enquanto trabalhava com o Departamento de Justiça e o FBI. O que é crucial entender sobre seu envolvimento com o governo dos EUA na tentativa de extraditar Julian Assange para os Estados Unidos, onde ele enfrentará um processo que pode condená-lo a 175 anos de prisão?
Jennifer Robinson: Bem, eu acho que é significativo que a acusação inicial contra Julian Assange seja relacionada apenas com as publicações em 2010, 2011, as publicações de Chelsea Manning. Foi uma segunda acusação, substitutiva, introduzida pela administração Trump, que se baseava nas evidências de Thordarson. Agora, qualquer advogado e até mesmo qualquer leigo estaria reavaliando as evidências de um criminoso condenado, que tinha sido condenado por falsificação, fraude e alegações de abuso sexual associado a menores. Essa fonte é problemática. Agora temos a admissão, da parte dele, que mentiu para o FBI sobre essas evidências. Isso levanta sérias preocupações sobre a integridade desta investigação e a integridade deste processo criminal, e um questionamento sério deve ter lugar no Departamento de Justiça sobre esta acusação e sua continuação.
Amy Goodman: Então, o que você está demandando agora, Jen Robinson?
Jennifer Robinson: Pedimos há muito tempo que a administração Biden e o Departamento de Justiça ponham um fim nesse caso por motivos de liberdade de expressão e por questões do devido processo legal. E esta é apenas mais uma, a última, evidência para mostrar por que este caso tem que ser encerrado.
Amy Goodman: Jen Robinson, quero agradecer a você por estar conosco, advogada de direitos humanos que assessora Julian Assange e o WikiLeaks desde 2010, falando conosco da Austrália.
(Publicado por Truthout | Traduzido por César Locatelli para Carta Maior)
 
 

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