Pensadores da Pátria Grande – Gregorio Selser
Texto: IELA
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México, 2008, pobreza generalizada e desemprego
Por Bruno F. Miranda – Sociólogo, UNAM-México
03.01.2010 – No início do mês de dezembro passado, foram divulgados os resultados do índice de pobreza nacional mexicano referente ao ano de 2008, pelo Coneval (Conselho Nacional de Avaliação da Política de Desenvolvimento Social), órgão descentrado da Sedeso (Secretaria de Desenvolvimento Social), vinculado ao governo federal. Segundo os resultados do Coneval, a pobreza multidimensional – denominação utilizada dessa vez – assola a 44,2% dos mexicanos ou o equivalente a 47,2 milhões de pessoas, contra os 47,4% anunciados em agosto do mesmo ano. Seriam, segundo a oficialidade, 3 milhões de pobres a menos nesse país.
Antes de partir para outros números, algumas palavras sobre as estatísticas oficiais anunciadas no México ao longo dos anos. As cifras anunciadas pelo governo federal têm sido denunciadas por jornalistas e intelectuais, que acusam o fato de estas sofrerem manipulação com fins políticos. Tanto as cifras como a nova metodologia de medição utilizada pelo Coneval para analisar a pobreza em 2008 foram novamente criticadas em meios da imprensa escrita mexicana por promover a minimização da pobreza e por sobrepor interesses políticos à objetividade técnica dos dados.
Assim, é considerada pobre multidimensional aquela pessoa que não tem renda suficiente para cobrir os bens e serviços necessários e que apresenta carência em ao menos um dos seguintes indicadores: renda per capita, educação, acesso à saúde, acesso à seguridade social, qualidade de moradia, serviços básicos de moradia e acesso à alimentação. Assim, segundo o Coneval, sua metodologia permite identificar tanto os mexicanos que se encontram em pobreza multidimensional como a “população vulnerável”, dividida entre a que tem carências sociais e a que apresenta baixa renda. Pobreza multidimensional e população vulnerável fazem parte, portanto, da tarefa de reconceitualização proposta, cujo fim é tornar a pobreza mais suave e tragável diante dos olhos dos eleitores.
Temos então que a população vulnerável por carências sociais é de 33% ou 36 milhões de pessoas; a população vulnerável por baixa renda é de 4,5% ou 4.8 milhões de pessoas. Somando as cifras, temos que 37,5% dos mexicanos e mexicanas se encontram em situação vulnerável, mas sem ainda ser considerada população pobre. Fazendo as contas, são mais de 35 milhões de pessoas que não são consideradas pobres oficialmente simplesmente porque não atendem aos requisitos da metodologia de análise do governo federal. Não fosse pelos dados maquiados, teríamos crus 81% da população nacional em estado de pobreza.
Além disso, dos 44,2% em pobreza multidimensional mencionados anteriormente, 33,7% se encontram em pobreza multidimensional moderada e somente 10,5% em pobreza multidimensional extrema, ou seja, com mais de três carências e com renda abaixo da linha de bem-estar mínimo (anteriormente denominada linha de pobreza alimentaria). São necessários mensalmente ao menos 613 pesos mexicanos – cerca de 47 dólares – em áreas rurais e 834 pesos – cerca de 64 dólares – em áreas urbanas, para alcançar o que se considera bem-estar mínimo.
Da mesma forma, a subdivisão do conceito de pobreza multidimensional (moderada e extrema) dá espaço à suspeitas. Além de nos levar a questionar o significado de vida digna, a maquiagem dos dados relativiza as necessidades primárias dos trabalhadores mexicanos, tornando-as menos urgentes do que realmente são, subordinando-as ao pragmatismo do governo panista de Calderón.
Como já era de se esperar, Chiapas é o estado mais pobre do México: 76,7% dos chiapanecos vivem em situação de pobreza multidimensional. Chiapas é seguido pelos estados de Guerrero, Puebla e Oaxaca, de extração basicamente indígena. Estes dados dão legitimidade às inúmeras lutas indígenas travadas nesse país. De acordo com a oficialidade, 75,7%, ou o que corresponde a 6,8 milhões de indígenas são considerados pobres multidimensionais.
Ainda que maquiados e reconceitualizados, os mesmo dados revelam 77,2% dos mexicanos com ao menos uma carência social, porcentagem explicada pela falta de seguridade social, que atinge a 64,7% da população e falta de acesso aos serviços de saúde, que atinge outros 40,7%. Se a isto agregamos as altas recentes nos preços da cesta básica, gasolina, eletricidade, gás, água e transporte, por um lado, e alta nos impostos, por outro, alguns já aplicados e outros válidos a partir de 1º de janeiro de 2010, temos que a pobreza do trabalhador e trabalhadora mexicana só se intensificará durante o próximo ano. Já não tem sentido o Acordo Nacional em Favor da Economia Familiar e Emprego, anunciado por Felipe Calderón em janeiro de 2009.
Além disso, em virtude da crise financeira atual e dos seus efeitos sobre a economia estadunidense, as remessas de trabalhadores mexicanos que vivem nos Estados Unidos reduziram-se em 35%. É a pior queda em mais de uma década da segunda maior fonte de renda mexicana, depois do que se obtém com a exportação de petróleo, (que também sofreu queda e baixa nos preços internacionais).
Em termos de emprego, o Inegi (Instituto Nacional de Estatística e Geografia) já havia anunciado uma taxa de desemprego de quase 6% ou o equivalente a mais de 2 milhões de trabalhadores que não possuem sequer espaço no mercado informal ou subemprego. Calderón, auto-titulado “presidente do emprego” durante sua campanha presidencial, não tem conseguido cobrir a demanda de mais 1 milhão de empregos por ano que exige o mercado de trabalho mexicano. Analistas apontam que somente foram gerados 83 mil empregos, 28 mil por ano, sem contar a crescente precarização laboral. Também decorrente da crise atual, 500 mil pequenas e médias empresas fecharam suas portas em 2009; algumas voltaram a abrir com outro nome e outras engrossaram a fila da informalidade.
O recente aumento real do salário mínimo, de 2,65 pesos mexicanos diários, cerca de 0,20 dólar, atinge principalmente os trabalhadores do comércio, já que a indústria mexicana se rege cada vez menos pelo trabalho formal (com direitos trabalhistas plenos). Com o aumento, firmado por representantes do Congresso do Trabalho, da Confederação de Trabalhadores do México (CTM), da Confederação Patronal da República Mexicana (Coparmex) e do governo federal, o trabalhador mexicano receberá mensalmente 1.723 pesos, cerca de 132,5 dólares, ou o que é equivalente a um aumento real anual de 967,25 pesos, cerca de 74 dólares.
A CTM e o Congresso do Trabalho alegam que o aumento irrisório do salário mínimo teve que ser aceito para manter empregos e produtividade, argumento já tornado clássico dentro do sindicalismo pelego. O presidente da Comissão Nacional de Salários Mínimos, Basilio González Núñez, afirmou que o sacrifício contribuirá à recuperação econômica, à sobrevivência da planta produtiva nacional e a melhorar as condições de vida dos próprios trabalhadores (sic!). O poder de compra do trabalhador mexicano se verá afetado e 2010 será seu terceiro ano consecutivo de perda de poder aquisitivo. Novamente, o trabalhador é quem tem de sacrificar-se para o “bom andamento” do sistema.
O estado de ânimo para 2010 é desalentador. O aumento salarial de 10% no Brasil tem sido referência entre analistas mexicanos. Enquanto no Brasil o salário mínimo diário é de cerca de 9,55 dólares, no México o mesmo cálculo não atinge sequer 4,5 dólares. Ao leitor mexicano a experiência brasileira pode parecer algo pelo qual lutar, mas nunca é demais recordar que o trabalhador brasileiro tampouco sai da cama com um sorriso no rosto.
Em termos de alimentação, o Coneval registrou quase 50 milhões de mexicanos e mexicanas, 45,8% da população, em situação de inseguridade alimentar. Ao menos 23 milhões têm problemas graves de alimentação, ou seja, deixaram de comer um dia ou de fazer alguma refeição por falta de dinheiro no bolso, segundo as definições da metodologia de análise adotadas. Novamente, apesar de oficiais, os dados nos mostram a gravidade do assunto.
Com mais de 80% em estado de pobreza, falta de empregos, quase sem ter o que comer, nos perguntamos o que vem a seguir. O certo é que o ano de 2010 tem muito pouco a ser celebrado como o ano do bi-centenário da “Independência Nacional”. Pelo contexto em que se encontram e pelo cenário que figura no horizonte, melhor será que os trabalhadores e trabalhadoras mexicanas o encarem como o ano do centenário da Revolução Mexicana.
Fonte: La Jornada, México, de 11 a 28 de dezembro de 2009
Texto: IELA
Texto: Consuelo Ahumada - Colômbia
Texto: Rafael Cuevas Molina - Presidente AUNA-Costa Rica
Texto: Resumen Latinoamericano/ Prensa Comunitária
Texto: IELA
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