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Nacionalizar o IFSC

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Por Marcos Neves em 02 de junho de 2023

Nacionalizar o IFSC

QUESTÕES SOBRE O MÉTODO E A CONCEPÇÃO DA MINUTA DA “POLÍTICA DE INTERNACIONALIZAÇÃO DO IFSC”

Prof. Marcos Neves
Assessoria de Física/DALTEC/Campus Florianópolis

O boletim digital do IFSC “Link Digital” #919 (19/05/2023) na seção “Outros destaques” comunica à comunidade escolar que está aberta a consulta pública à minuta da “Política de Internacionalização do IFSC”.

Conforme a matéria jornalística, a minuta vem sendo elaborada desde agosto de 2022 pela Assessoria de Relações Externas e Assuntos Internacionais (AREXI), sendo que neste período passou por análise dos responsáveis pela internacionalização dos Câmpus. Aos alunos e servidores coube somente a possibilidade de manifestarem-se dentro de um calendário que vai até o dia 6 de junho.

Cabe inicialmente fazer uma crítica à metodologia adotada pela AREXI, que não permite uma reflexão global sobre qual é a natureza da inserção acadêmica, científica e tecnológica do IFSC no plano internacional, uma vez que coube aos servidores, estudantes e entidades representativas destes segmentos somente fazer suas contribuições aos artigos e capítulos da minuta de forma isolada e fragmentada.

Na ausência de uma reflexão mais global, qualquer contribuição pontual à minuta corresponde corroborar com a lógica geral do documento, que reforça o que vou chamar aqui de “mentalidade colonizada”, que permeia toda a minuta.

Para iniciar o debate da minuta, vou propor uma alteração no título: onde se lê “Política de Internacionalização do IFSC” leia-se “Diretrizes para parcerias internacionais para nacionalização do IFSC”.

Vamos iniciar pelo termo “internacionalização do IFSC”. Ora, o IFSC é uma instituição NACIONAL vinculada ao Estado brasileiro e, portanto, sua missão é integrar-se aos esforços de superarmos a dependência científica e tecnológica do país e incorporar-se como autarquia nos esforços de construção de um projeto de inserção soberana do Brasil na economia internacional e não reforçar a atual divisão internacional do trabalho que relega aos países periféricos, como o Brasil, no máximo a participação nos projetos de inovação ou adaptação de tecnologias proprietárias dos países centrais.

As grandes universidades americanas, alemãs, chinesas, japonesas, canadenses, não são instituições internacionais, são instituições nacionais completamente integradas ao projeto nacional de seus países. Elas não renunciam aos seus projetos de curso em nome de uma “internacionalização” ou “dupla titulação”, pois têm plena consciência que as suas parcerias internacionais devem responder ao PROJETO NACIONAL do seu país.

Nossas parcerias internacionais, nossos projetos pedagógicos de curso (PPCs) e nossos projetos de pesquisa e extensão devem estar voltados para os grandes problemas e desafios que o Brasil enfrenta atualmente. Os conhecimentos científicos, tecnológicos e culturais organizados nos currículos dos nossos cursos devem buscar inserir nossa juventude nas reflexões e soluções desses grandes problemas e desafios do Brasil. É a partir desta perspectiva que vamos definir a natureza das parcerias e da inserção internacional do IFSC. Os parceiros devem ser aqueles que realmente se enquadram na etimologia da palavra “parceiro”, ou seja, um parceiro faz parte das intenções da outra pessoa.

Portanto, o que deve orientar a parceria internacional é a identificação do problema social e econômico que institucionalmente propormos resolver ou participar de sua resolução. Se adotarmos esta perspectiva, já teremos um bom critério para selecionar os parceiros e internamente vincularmos nossos servidores, estudantes e gestores a projetos que tenham um novo olhar para o Brasil. Como diz o ditado, “para voar é preciso ter raízes”. Fora dessa perspectiva, só restará ao IFSC se submeter os interesses e projetos individuais que a médio prazo descaracterizam a instituição ao fortalecerem “ilhas de interesses” daqueles cujo único interesse é ser “cidadão do mundo” e um dia evadir-se do Brasil ou ser contratado por uma grande corporação multinacional.

Politicamente, a minuta está eivada de uma visão de globalização(??) típica da consciência ingênua. Ela reforça a ideia de que a internacionalização da economia, da ciência e tecnologia é simétrica. A minuta desconsidera a real assimetria no desenvolvimento científico e tecnológico no plano internacional, cuja consequência imediata é a fuga de cérebros dos países periféricos e dependentes, como o Brasil. Neste quadro internacional assimétrico, o que é reservado às instituições acadêmicas dos países periféricos, a exemplo do IFSC, é somente parcerias menores, desconectadas dos grandes objetivos estratégicos de soberania científica e tecnológica do Brasil, quando não, ações fragmentadas que atendem somente estratégias de mercado e não do Estado brasileiro.

Portanto, deveríamos ter a coragem de renunciar ao termo “internacionalização do IFSC”, mesmo sabendo que é um termo consolidado no senso comum dos gestores, professores e estudantes. Só teremos o respeito internacional como instituição acadêmica se formos uma instituição NACIONAL conectada com os grandes problemas e desafios postos no atual momento para o Brasil. Apontar claramente que o que orienta nossa política de parcerias internacionais são os esforços do Estado brasileiro de consolidar os grandes projetos que possibilitem a soberania nacional nas diversas áreas de tecnologias e ciências básicas: digital, aeroespacial, vacinal, militar, comunicação, saúde tropical, etc.

Por último, a minuta “Política de Internacionalização do IFSC” é tão extensa que dificulta qualquer debate, dado que trata ao mesmo tempo temas estratégicos, táticos e operacionais. Tudo está dentro de um mesmo documento: definições, diretrizes, princípios, operacionalização de parcerias, regras de intercâmbio, internacionalização de currículo (???), gestão das parcerias, etc. Neste momento o que o IFSC precisa é de um documento claro que aponte de forma cristalina a política e as diretrizes para suas parcerias internacionais.

 

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