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Venezuela e o petróleo

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Por Elaine Tavares em 09 de dezembro de 2022

Venezuela e o petróleo

Texto de Elaine Tavares

Quando Hugo Chávez assumiu a presidência da Venezuela em 1998 ele tinha bem claro que seria difícil tirar o país da sua lógica histórica de viver do rentismo petroleiro. Naqueles dias o país praticamente importava tudo o que consumia. Por isso que um dos pilares da economia chavista foi a proposta de crescimento endógeno, buscando ampliar a indústria bem como a produção de alimentos. Mas, sua opção pelo socialismo fez da Venezuela mais um inimigo perfeito para os Estados Unidos e o governo de Chávez passou a ser atacado de todas as formas. Até mesmo um golpe de estado foi armado para tirar o inoportuno do caminho da velha elite petroleira, até porque Chávez estava invertendo as prioridades usando a renda petroleira em benefício da população.

Para os Estados Unidos, Chávez e o bolivarianismo eram pedras muito inconvenientes. Quando Chávez morreu em 2012 deixando Maduro como seu vice, mais uma onda de ataques partiu dos EUA. Maduro não poderia assumir, era ilegal e outros quetais. Foi realizada nova eleição. Maduro venceu. Era preciso lidar com ele. Mas, os EUA não queria lidar com Maduro. Definiu duras sanções contra o país, incentivou a criação de um presidente fictício – Juan Guaidó – e iniciou uma guerra econômica contra a Venezuela buscando estrangular a economia e, assim, o governo. Foram anos duros para a população que viu o preço do petróleo cair, os recursos do país serem roubados pelos bancos estrangeiros e os produtos necessários para a vida deixarem de chegar às prateleiras. Milhares de pessoas buscaram o caminho da migração e outras tantas, que ficaram, enfrentaram o pão que o diabo amassou por conta das sanções e do roubo das divisas. Nem mesmo quando chegou a pandemia do coronavírus em 2020 o império estadunidense aliviou. Sem o dinheiro que havia sido surrupiado pelos bancos à mando dos Estados Unidos não havia recursos para comprar material hospitalar, nem remédio, nem vacina. Foi um drama. Ainda assim a população enfrentou com valentia e o governo acabou conseguindo ajuda da China e da Rússia para o combate à doença.

Os Estados Unidos seguiam dispostos a derrubar Maduro de qualquer maneira a ponto de até tramarem o seu assassinato chegando a oferecer um preço pela sua cabeça, num ato criminoso e terrorista que jamais foi questionado pela mídia internacional ou pelos movimentos de direitos humanos. Uma tentativa levada a cabo por um grupo de mercenários foi desarticulada, mas a recompensa prometida seguiu colocando em risco o presidente Maduro.

Só que o tempo passou e a economia mundial teve uma viragem de timão. A guerra fomentada pelos Estados Unidos na Ucrânia levou a Rússia a atacar o país vizinho e logo em seguida sofrer sanções por parte dos EUA. O resultado disso foi a fragilização da Europa que depende, e muito, da Rússia para garantir a energia que movimenta a vida. Além disso, novos conflitos na região do oriente médio obrigaram os Estados Unidos a voltar novamente os olhos para a Venezuela, afinal, ali, no norte da América do Sul, está concentrada a maior reserva de petróleo bruto do mundo. Não é à toa, portanto, que cause tanto alvoroço um governo não alinhado aos EUA.

O fato é que a guerra na Ucrânia obrigou tanto os Estados Unidos quanto a Europa a buscar novas alternativas e os governos, de repente, voltaram a querer normalizar as relações com a Venezuela de olho no seu petróleo. Foi paradigmático o encontro entre Maduro e o presidente francês na COP27. Macron todo simpático com aquele a quem toda a mídia chama de “ditador” apesar de ter sido eleito democraticamente nas duas eleições que disputou.

Maduro que não é bobo imediatamente abriu caminho para negociações, afinal quer recuperar o dinheiro que estes países – através de seus bancos – roubaram do povo venezuelano. Telefonemas pra lá, telefonemas pra cá e os “velhos inimigos” agora se apresentam cheios de salamaleques. Maduro está disposto a vender o petróleo, mas diz que não vai abrir mão da soberania da Venezuela. Isso ainda vamos ver.

Nesta semana Maduro fechou acordo com umas das grandes do chamado grupo das Big Oil, a estadunidense Chevron. “Nós temos o petróleo que os EUA e a Europa precisam”, afirmou, e começou as tratativas para tornar a Venezuela a segunda maior provedora de petróleo do mundo. Com esse acordo junto a Chevron Maduro pretende extrair e produzir na Venezuela o petróleo que movimentará o mundo. Até agora boa parte das refinadoras de petróleo do país está nos Estados Unidos por conta de décadas de subserviência. A parceria com a Chevron vai permitir que o setor de petroquímica cresça e com isso o governo vai também poder ampliar todo o bloco de produção de gás.

Maduro está aproveitando o momento, buscando fazer acordos que favoreçam a Venezuela e permitam que a população saia do aperto provocado pela guerra econômica imposta pelos Estados Unidos. Segundo ele isso não vai parar o projeto de ampliação da produção local que quer garantir uma economia livre do rentismo petroleiro. Por isso, quando anunciou o acordo com a Chevron também conclamou o empresariado local a investir num novo modelo de economia diversificada. O presidente também informou à população que este ano no PIB da Venezuela vai ter um incremento de dois dígitos. “Isso é maravilhoso para nossa economia, porque esse incremento se dá a partir de uma riqueza que não é petroleira e nós vamos manter essa linha”. Maduro ressaltou que as sanções contra a Venezuela fizeram muito dano ao povo, mas que ele não vai ideologizar as relações comerciais. O que puder lucrar dos governos europeus e até dos Estados Unidos para melhorar a vida dos venezuelanos, ele vai lucrar.

A mudança na relação dos governantes europeus com a Venezuela em função de que agora precisam dela já fez com o governo venezuelano recuperasse três bilhões de dólares que tinham sido surrupiados pelos Estados Unidos e Europa como resultado de um acordo firmado entre o governo e as oposições que dialogam na Plataforma Unitária. Uma vitória importante de uma mesa que se estendeu por meses tendo o governo do México e da Noruega como mediadores, e que chegou a esse resultado no dia 26 de novembro. “Não temos problema algum de dialogar com adversários e até com inimigos, se for para o bem dos venezuelanos”.

Resta saber se essa mudança nas relações conseguirá se fazer sem que a Venezuela perca soberania. É um complexo e intrincado tabuleiro geopolítico que Maduro parece estar conseguindo manejar muito bem. Lembrem que Macron, o presidente francês, que apoiou e financiou o golpista Juan Guaidó, e que sempre chamou Maduro de ditador – assim como toda a mídia internacional pelega – apertou a mão de Maduro no Egito, meigamente o chamando de “presidente”. Pois é! O mundo também capota.

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