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Venezuela:”Será muito difícil nos vencerem”

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Por IELA em 02 de abril de 2019

Venezuela:”Será muito difícil nos vencerem”

Entrevista realizada pela reportagem da Revista Intersecciones com Stalin Pérez Borges, Veterano militante socialista, integrante de LUCHAS (Liga Unitaria Chavista Socialista) e do Conselho Consultivo da Central Bolivariana Socialista dos Trabalhadores e Trabalhadoras (CBST).
 
Antes de mencionarmos a actual crise política, como descreverias a crise social e económica que se vive na Venezuela? 
Esta pergunta leva-me a uma resposta bastante longa pelo que começo pedindo desculpas pelo cansaço que possa causar. A crise económica e social que se acelerou vertiginosamente desde há uns cinco anos e chegou a esta lamentável situação de hiper-inflação a que com duras penas sobrevivemos, bate recordes mundiais e é responsável pelo grande descontentamento que há nesta conjuntura de grande alteração na correlação de força política, é consequência, para mim, de três factos fundamentais: dois deles circunstanciais e um de carácter estrutural. 
As circunstâncias são, em primeiro lugar, a sabotagem e o bloqueio económico, qualificado pelo governo como “Guerra Económica”. Este facto é o mais determinante desta gravíssima situação económica e social que suportamos. O cerco comercial e o bloqueio contribuíram para uma paralisação de 80% do pouco que já se vinha produzindo nas industrias do país, ao mesmo tempo que impôs uma grande redução dos enormes níveis de importações que estavam sendo feitos de alimentos, medicamentos, matérias-primas e máquinas. E é também a origem do açambarcamento em que comerciantes inescrupulosos fixam os preços de todos os tipos de bens, incluindo o dólar. 
A segunda coisa que é circunstancial, pelo índice exponencial que teve nos últimos cinco anos, é a corrupção, a incapacidade e a impunidade, embora também seja antiga. Corrupção e incapacidade por parte dos funcionários do governo são muito grandes e prejudiciais. Em muitos casos, a acção de sabotagem do empregador e do imperialismo é triangulada, com a cumplicidade implícita de militares e civis, em relação ao valor especulativo dos preços finais dos bens que a população deve adquirir. 
E o problema estrutural é o da pouca capacidade produtiva nacional. Isso deve-se também ao alto nível histórico da chamada renda do petróleo, que fez da burguesia crioula uma classe social parasitária, que sempre dependeu do preço do barril de petróleo. Preferindo importar mais do que produzir e exportar. Herança genética ou cultural, que arrastou a velha burguesia e a actual burocracia estatal corrupta e a já insurgente boli-burguesía destes últimos 18 anos. 
Neste facto estrutural da pequena produção industrial nacional há 50 anos de responsabilidades da IV República e dos 20 anos da V República. Com Chávez, apesar de alguns programas correctos e planos para recuperar o desenvolvimento da indústria nacional, eles foram deixados no papel, não se conseguindo concretizar o necessário aumento da produção nacional. De 2007 a 2012, essa incapacidade de produção não causou descontentamento, pois os altos preços do petróleo foram suficientes para importar até o mais luxuoso. 
Mas desde 2013 até agora com Maduro, este fracasso foi amplamente pago. Quando os preços do petróleo baixaram, deixou de haver dinheiro para importação ou para a indústria nacional, incluindo a das transnacionais, deixou-se de receber os dólares habituais garantidos pelo controle cambial existente. A luta por parte desses sectores sociais para se apropriarem da distribuição dessa renda é a principal razão pela qual nestes 20 anos de chavismo as conspirações e o ódio de morte não cessaram. E aqui, na sua posse e aproveitamento, é que também entram em jogo os interesses do imperialismo ianque e europeu. 
No dia 23 de Janeiro, houve uma nova mobilização da oposição, no contexto do clima golpista que inaugurou a “autoproclamação” de Juan Guaidó como “presidente efectivo”. Qual foi a magnitude dessas mobilizações e seu nível de apoio entre as classes populares? Existe um aumento da base de apoio das classes populares para a oposição ou mantém sua linha de água nos sectores médio e altos? 
As marchas de 23 de Janeiro convocadas pela oposição foram impressionantes pela sua dimensão. As concentrações de Caracas e Valência tiveram grande impacto tanto para os próprios como para estranhos. Isso deu-lhes muito ânimo. Os sectores da direita estavam muito retraídos desde a eleição da Assembleia Nacional Constituinte. Desde essas eleições até este 23 de Janeiro estiveram muito ausentes no cenário das mobilizações. Apenas se dedicavam a campanhas mediáticas contra o governo (aproveitando o descontentamento que se espalhou porque o governo foi incapaz de combater com medidas eficazes os efeitos da “guerra económica”) e contra a cumplicidade de funcionários corruptos que têm permitido a especulação dos comerciantes. 
As grandes soluções que o presidente Maduro alcançou foram a entrega da famosa sacola de alimentos, contida nos CLAP (Comités Locais de Alimentação e Produção); os decretos de Senhas de Compensação, aumento contínuo do salário mínimo e tickets de alimentação para trabalhadores. Medidas progressistas, mas que não foram suficientes para cobrir a perda do poder de compra dos salários. Assim, nas mobilizações da direita de 23 de Janeiro estavam presentes a base social habitual dos sectores de classe média com sectores trabalhadores, incluindo alguns sindicatos que até ao início deste ano se reivindicavam do chavismo. 
Qual é o estado de ânimo das classes populares afins ao governo? Qual é o seu nível de combatividade, rejeição do golpe e apoio ao governo? Há fenómenos de auto-organização ou toda mobilização popular permanece subordinada à iniciativa governamental? 
Não me perguntou, mas é bom levar em conta o seguinte para as análises e as caracterizações: depois de 23 de Janeiro a oposição fez grandes esforços para superar ou trazer o mesmo número de pessoas em Caracas e Valência; eles mobilizaram-se novamente em 2 de Fevereiro, mas já não foram os mesmos em quantidade e expectativas que as demonstrações de 23 de Janeiro. As mobilizações do chavismo de 23 de Janeiro em Caracas foi bastante concorrida, mas não tiveram força de mobilização noutras cidades. No entanto, “o estado de ânimo das classes populares apoiante do governo” é bastante alto. Nos dias 28, 29, 30, 31 de Janeiro e 1 e 2 de Fevereiro, os chavistas também organizaram em mais de seis cidades mobilizações espectaculares e surpreendentes. A concentração de Caracas de 2 de Fevereiro teve uma presença como nos melhores tempos de Chávez. Então, neste momento, o chavismo está mais encorajado para tomar a ofensiva contra o golpe de estado ou a invasão em curso. Não há por agora expressões visíveis de auto-organização das bases. O peso da convocatória é realizado pelas estruturas do PSUV e do governo. No entanto, pessoalmente, fico impressionado com a presença de muitos jovens nessas mobilizações. 
Parece evidente que a estratégia do golpe tem como um de seus objectivos centrais romper o apoio monolítico das Forças Armadas ao governo. Como vê este aspecto? Acha plausível uma intervenção estrangeira sem uma ruptura interna das Forças Armadas? 
Desde muito antes de 10 de Janeiro, a oposição e altos funcionários do governo Trump e até mesmo senadores daquele país e alguns governos como o de Duque da Colômbia, Bolsonaro do Brasil, Macri da Argentina e Luis Almagro da OEA, estão à espera que a queda de Maduro venha de sectores das Forças Armadas Nacionais Bolivarianas (FANB). Mas até hoje isso falhou. Aos membros das FANB foram oferecidas altas somas de dólares e garantias de perdões e nomeações para altos cargos. A partir da autoproclamação de Guaidó como presidente interino, a grande proposta desse usurpador é dirigida aos membros das FANB, promovendo uma suposta Lei de Amnistia para os militares que se revoltem contra o governo de Maduro. Esta política pode ter algum efeito psicológico em vários oficiais no activo, mas não foi registado nada de significativo interna ou externamente às FANB para fazer crer que surja uma força capaz de se envolver numa aventura suicida com o imperialismo e seus lacaios da oposição. 
Como caracteriza globalmente a estratégia da direita e do imperialismo e como avalia o sucesso dessa estratégia até agora? 
A estratégia do imperialismo foi sempre derrubar o governo chavista a qualquer custo. A saída de Maduro foi planeada a médio e curto prazo. A partir do momento em que assumiu o poder em 2014, eles tentaram expulsá-lo. E neste momento estão numa fase de urgência. Essa é a razão pela qual os acontecimentos para atingir essa meta ocorrem mais rápidos do que as avaliações que eles fazem das suas operações. Eles precisam pôr fim a Maduro e à experiência da Revolução Bolivariana e fechar o ciclo de instabilidade e governos chamados progressistas e mais ou menos soberanos que irromperam no nosso continente depois de Chávez ter assumido o processo revolucionário e começado a governar. 
Com a traição de Lenine Moreno no Equador, tendo recuperado totalmente o Brasil e a Argentina, nesta correlação de forças favorável na região, o imperialismo fez o resto. Claro, eles querem expulsar Maduro e derrotar o processo bolivariano com o menor custo possível político a curto prazo, mas se falharem, eles tentarão fazê-lo a qualquer custo. Trump é um projecto dos sectores do imperialismo que procuram desesperadamente que os Estados Unidos voltem a ter a hegemonia mundial económica, política e militar. Eles querem recuperar a superioridade económica, financeira e industrial da qual a China os desloca. A força que eles mantêm, fundamentalmente, é a militar. Eles não vão adaptar as suas agressões, esta batalha para expulsar Maduro ou tem um guião específico ou um golpe de Estado clássico. 
Há os exemplos concretos que foram encenados: há cerca de dez anos: em 2009, removeram Zelaya, não no mesmo estilo com o qual sempre houve golpes nas Honduras; depois, levaram Lugo para fora do Paraguai com um golpe parlamentar em 2012; e três anos depois, com golpe parlamentar e “impeachment”, demitiram Dilma e injustamente prenderam Lula. E, para completar, o imperialismo contribuiu para o surgimento de presidentes no Brasil de Bolsonaro, Macri na Argentina e recentemente Nayib em El Salvador. Para isso vêm usando outras armas, como o fake news. 
Com este novo instrumento, enganam e confundem grandes faixas da população. Claro que nesses casos foram ajudados pela má gestão dos governos da FMLN, por Cristina Krusher e pelo PT no Brasil. Então, voltam-se para a Venezuela, teríamos que especificar que o imperialismo está a usar dois instrumentos aqui: a ameaça de recorrer à acção militar e a aplicação da campanha de mensagens fake news. Sobre esta questão podem surgir algumas variantes como a que surgiu na década de 90 na Nicarágua com o Acordo de Contadora/Esquipula e a subsequente derrota eleitoral dos sandinistas nas mãos da insípida Violeta Chamorro. Aqui, neste caso, haveria uma derrota do processo Bolivariano e Chavista. Facto que eles não conseguem desde há quase 20 anos. Mas essa história não está escrita, está a ser escrita e, por enquanto, não estão ganhando. O sentimento anti-imperialista do nosso povo é histórico e muito grande. Vai custar muito derrotar-nos. 
Dificilmente a maioria dos trabalhadores e os pobres aceitarão levantar a bandeira dos EUA, como fez Guaidó e a liderança política da direita que o acompanha nas suas reuniões públicas. Aqui, desde a greve petrolífera de 1936, que se tornou quase uma greve nacional contra os gringos e ingleses e a ditadura militar governante, existe um profundo sentimento anti-imperialista, foi construído e revivido por mais de quinze anos, com as mensagens e ensinamentos de Chávez. Aqui eclodiu uma rebelião insubmissa que nunca parou, desde 27 e 28 de Fevereiro de 1989; e a luta resoluta, sem medo, expressa nos acontecimentos de 13 de Abril de 2002 e a resposta à greve patronal e sabotagem petrolífera e todos estes enfrentamentos de resistência que temos feito para impedir o imperialismo de tirar pela força Maduro. Lembramos que na Nicarágua eles desenvolveram uma guerra civil e usaram a guerrilha e a traição do Comandante Éden Pastora para alcançar os seus objectivos. 
Existe uma imagem internacional generalizada do governo de Maduro, não apenas na imprensa imperialista, mas também dentro de sectores da esquerda, que a descreve como um governo completamente degenerado, corroído pela corrupção, burocratização e autoritarismo político. Uma espécie de “termidor bolivariano” que teria acabado com todas as conquistas de Chávez. Há sectores da esquerda que colocam o actual confronto como uma “polarização reaccionária” (que parece ter em mente um paralelo em experiências como as de alguns países do Médio Oriente, onde o imperialismo e o fundamentalismo islâmico se confrontam, e onde ambos os sectores representam uma desgraça para sectores populares). O que acha dessa caracterização? Como avalia os elementos de autoritarismo, corrupção e burocratização presentes no governo de Maduro? Houve repressão à esquerda, sindicalistas ou movimentos sociais? Que papel o anti-chavismo desempenhou? 
Sim, existem sectores da esquerda, incluindo muitas organizações de origem trotskista, que qualificam o governo de Maduro ou o regime, de ditadura, fascista, criminoso e que mantém centenas de presos políticos e até mesmo um governo ilegítimo. Eles repetem e coincidem com a campanha que a imprensa mundial burguesa faz. Essas qualificações são bases de apoio do imperialismo, de alguns governos da região e dos sectores de direita venezuelanos, que são usados para solicitar a intervenção militar e solicitam o congelamento das contas da PDVSA em bancos estrangeiros, expropriar a ouro depositado na Inglaterra ou outros roubos contra os recursos do país. Para mim, essas qualificações são muito desajustadas e não correspondem de forma alguma à verdade. 
Eu tenho sido um crítico das políticas erradas dos governos de Chávez e Maduro. Sim, na Venezuela existem infinitos problemas económicos e sociais, onde o governo de Maduro tem muitas responsabilidades. Nem o governo de Chávez e muito menos o de Maduro são socialistas, independentemente de terem colocado o rótulo de socialista nas lojas de distribuição do governo que faziam vendas a preços reduzidos ou em qualquer outra empresa ou serviço. As altas taxas de corrupção de funcionários do governo e de todas as instituições do Estado são inegáveis; a óbvia incapacidade de resolver a crise económica, de impedir o défice fiscal, a fuga de capitais, controlar o preço do dólar e as estruturas de custos para produzir e comercializar é evidente. É um governo que continua a pagar a dívida externa no momento do bloqueio económico imperialista. Não se tocou em nenhum dos monopólios, como o grupo Polar ou outros, quando estes monopólios são aqueles que escondem alimentos ou os distribuem à sua vontade e com sobrefaturação. 
Eu moro em Valência, a cidade industrial do país, e sou sindicalista, posso dizer-lhe que as áreas industriais estão quase paralisadas, há sectores industriais total ou quase completamente paralisados; as condições de trabalho, de segurança, de salários em sectores fundamentais como electricidade, petróleo, saúde, ensino deterioraram-se de forma alarmante. Mas, temos que ser claros, em toda esta realidade pesa a responsabilidade do governo e também o bloqueio económico e comercial contra a Venezuela. No entanto, é loucura e baixeza comparar o governo de Maduro com os regimes que há no Médio Oriente, onde não há democracia e liberdades. Isso é incomparável e inaceitável. Que o governo de Maduro tenha cometido actos de autoritarismo e reprimido alguma marcha e impedido alguma greve? Com certeza que sim. Eu não justifico esses excessos. Mas isso não merece a qualificação de repressivo ou a magnitude dessa campanha de denúncia que eles fazem. Não é feita a mesma campanha feita contra o Brasil, Argentina, Colômbia, México ou outro governo, onde a repressão e crimes de Estado são mais que evidentes. 
Existem alguns presos políticos e teríamos que abrir uma comissão de inquérito para saber quantos e quem eles são. No entanto, nem todos os prisioneiros que a direita (e mesmo aquela “esquerda” anti-chavista) dizem existir o são. Na lista que eles apresentam estão os anti-chavistas assassinos, como aqueles que queimaram pessoas vivas que encontraram em shoppings localizados em áreas residenciais de classe média por serem considerados chavistas apenas pelo seu aspecto físico. Essa lista de presos políticos está cheia daqueles que degolaram chavistas motorizados, aqueles que impediram o livre trânsito e foram responsáveis por essas acções violentas e pelas mortes. Existem sectores de anti-chavistas ou anti-maduristas de esquerda, que consciente ou inconscientemente, fazem o trabalho da direita. 
O que achou da recente reunião dos membros da Plataforma Cidadã em Defesa da Constituição com Juan Guaidó? 
Triste. Senti uma pena muito grande. É muito vergonhoso. Conheço a maioria daqueles que estiveram naquela reunião representando a Plataforma Cidadã em Defesa da Constituição (PCDC) com aquele líder golpista e agente do imperialismo, Juan Guaidó. Há muito tempo que tenho um grande respeito e apreço por quase todos eles. Mas esta acção é muito questionável de qualquer ponto de vista. Seus grandes argumentos são que eles foram encontrar-se com Guaidó para “evitar a guerra”, e para “o povo soberano se expressar num referendo consultivo”. 
Essas duas premissas significam: 1) eles não acreditam que Guaidó seja um agente do imperialismo que inventou um auto-nomeado presidente da Venezuela como parte da obra-prima de dar o grande golpe do século, que está em desenvolvimento. Assim, os do PCDC não acreditam que Guaidó e toda a sua rede não passem de uma manobra do imperialismo ianque e sejam as causas que podem levar-nos a um cenário de violência e mortes, além de uma ocupação na Venezuela; e 2) acaso não sabem os do PCDC que ao querer fazer um referendo consultivo ou chamadas eleições presidenciais, quando o presidente eleito apenas tomou posse há um mês, isso só serve como uma saída para os golpistas imperialistas. Propor e concordar com um referendo consultivo ou eleições presidenciais, com o usurpador e grande representante na Venezuela do imperialismo e governos cúmplices, os mesmos que impuseram bloqueio económico e comercial, que são as principais causas desta crise económica, esta hiper-inflação que faz com que nossos salários não cheguem até nós, está a fazer o jogo deles. Eleições com cerco económico e militar imperialista? O que é isso? Encontrar-se com aquela canalha para propor que ele evite a guerra, quando ele e seus mestres são aqueles que a estão incitando? A maior ironia é que eles se chamam de Plataforma em “Defesa da Constituição”. Há que dizer-lhes como no México: “não a defenda assim, compadre”. Se isso for apenas ingenuidade, eles vão ter que suportar todas as qualificações que hoje diferentes grupos e organizações lhes estão proporcionando. 
Li as declarações de Gonzalo Gómez, referindo-se ao que ele chama de “distorções e calúnias sobre o encontro com Guaidó”. Sempre tive Gonzalo em grande estima e apreço. Temos uma junta de militância revolucionária de longa data. Fomos líderes do PST “La Chispa”, estive com ele até o final de 2015 na coordenação nacional da Marea Socialista e ainda estamos no espaço de publicação da Aporrea . Nessa declaração ele diz que: “Eles pretendem confundir o significado da iniciativa: evitar a guerra e expressar a soberania num referendo consultivo”. No entanto, ele não diz que deturpações e calúnias são as que o acusam, excepto que: “Não foi na Embaixada colombiana como eles maliciosamente quiseram fazer ver em redes sociais e com fake news, dos mercenários informáticos”. Além disso, na sua resposta ele informa que também estão solicitando uma reunião de emergência com Nicolás Maduro, com os mesmos pontos e objectivos da reunião já realizada com Guaidó, mas dizendo que a PCDC não reconhece Guaidó como presidente da República, mas da Assembleia Nacional. E termina em sua declaração com isto: “As únicas reuniões que foram realizadas são nas embaixadas do México, Uruguai e Nunciatura Apostólica para apresentar a mesma abordagem, enfatizando a mediação para o plural e o diálogo social, e não cúpulas ou cenáculos, e, claro, no quadro democrático-constitucional que a Constituição da República Bolivariana da Venezuela nos dá”. Com esta última parte, o bom é “saber” que se eles (PCDC) participaram nessas mediações para o diálogo plural e social não são “cúpulas ou cenáculos”. Isto é tudo o que posso dizer sobre o encontro do PCDC e Guaidó e suas consequências. 
Há sinais de que o governo está disposto a negociar politicamente com a direita uma capitulação ou uma transição “ordenada”? 
Deve haver membros do governo, incluindo civis e militares, que agora desejam negociar com sectores da direita venezuelana e do imperialismo. Há muitos que ocupam altos cargos executivos e das FANB que não são nem anti-capitalistas nem anti-imperialistas. Há quem diga que têm medo de uma intervenção militar imperialista ou de uma situação de guerra civil. Mas, uma coisa é o que se quer e o que as condições objectivas e a luta de classes podem nos trazer. Será que a liderança política do PSUV, o presidente Maduro e o ambiente fundamental do governo vão aceitar uma eleição presidencial ou um referendo consultivo dentro de 30 dias ou três meses, supervisionadas pelas mesmas agências multilaterais que ao longo deste período os hostilizaram quando está apenas a começar o período constitucional? Quando você ainda tem uma base social respeitada e determinada para resistir aos ataques? As tensões entre as partes vão diminuir ou o imperialismo vai se mobilizar ainda mais? 
Representantes do governo participarão na conferência convocada em Montevideu, no Uruguai, no final da semana. Eles procurarão o caminho do diálogo. Eles anunciam que o mecanismo de funcionamento será apresentado em quatro etapas: 1) “Diálogo imediato”, isto é, sentar à mesa; 2) Negociação; 3) “Compromissos ou acordos” e 4) Implementação”. Ok, e em que momento ocorrerá o desenvolvimento desses quatro estágios? A outra pergunta intrigante é: nesse período de diálogo e implementação dos acordos o que fará o imperialismo? Levantará as sanções ou manterá seus canhões e mísseis para acelerar a implementação dos acordos? 
Qual é a realidade das “milícias populares”? Que capacidade de resistência militar teria o governo venezuelano em caso de intervenção estrangeira ou guerra civil? 
Numa declaração pública de LUCHAS solicitámos com carácter URGENTE a distribuição, pelo menos, em cerca de 11 mil territórios, igual número de oficiais e sub-oficiais das nossas FANB, para que convivam com as comunidades e organizem no campo militar a resistência anti-imperialista. Eu acredito que a aliança cívica militar deve ser feita a partir dos espaços comunitários. Nesta declaração, dissemos o seguinte: “Nesse ambiente, pedimos aos trabalhadores e ao povo que integrem voluntariamente as 50 mil Unidades de Defesa Popular em todos os bairros, cidades e em todos os cantos do país (entidades de trabalho e estudo), para que apoiem e fortaleçam a Defesa Integral da Pátria, que o presidente Maduro pediu para se realizar”. 
As milícias populares ou unidades de defesa popular estão em processo de construção. O corpo das milícias existe há anos e já existem dois milhões de militantes, muitos dos quais estão a ser chamados para se inserirem como soldados activos e permanentes nas FANB. Diz-se também que a capacidade de armamento do FANB é muito moderna, que tem boa logística e um profissionalismo muito respeitável. 
Também queremos formar as “Brigadas Internacionais Simón Bolívar” de solidariedade com a Venezuela. E que 1) a Federação Sindical Mundial (FSM), centros nacionais, federações, sindicatos e outras organizações dos movimentos sociais do mundo, forneçam medicamentos, alimentos e matérias-primas para o governo legítimo do Presidente Maduro e/ou sindicatos e ao movimento social venezuelano. 2) Que as organizações sociais da América Latina organizem caravanas de solidariedade com a Venezuela e entrem pelas nossas fronteiras com a Colômbia e o Brasil. 
O governo parece estar paralisado há muito tempo no campo socioeconómico. Nesse aspecto, o governo mostra, em primeiro lugar, incompetência para enfrentar o cerco económico e a queda dos preços do petróleo, mas também algum grau de responsabilidade por alguma desorganização económica geral que não pode dever-se apenas a uma sabotagem deliberada, mas que é também uma consequência, mais objectiva, da aplicação de fortes políticas redistributivas sem uma ruptura decisiva com a estrutura capitalista herdada (que leva a uma paralisação do investimento, fuga de capitais, inflação, etc). O governo tem alguma iniciativa a esse respeito? Medidas drásticas como a nacionalização do sector bancário e do comércio exterior ou a expropriação de empresas que especulam com o sofrimento popular estão presentes nos debates ou são propostas por algum sector do governo? 
Considero que estes pontos em que se baseiam tuas perguntas são os calcanhares de Aquiles do governo. E se não agir desde já e não resolver as consequências da sua paralisia no terreno económico e social, isso o prejudicará mais do que qualquer míssil ou entrada da “ajuda humanitária” imperialista. Se não conseguir controlar, de maneira eficaz e de longo prazo, a especulação cambial e de abastecimentos, os preços de alimentos e medicamentos e estimular a produção nacional de bens de consumo e serviços, a médio prazo acabará por perder sua base social e dificilmente sobreviverá. Entre outras coisas, tem de decidir não continuar a pagar a dívida externa, impedir a fuga de capitais, impor impostos progressivos sobre o património e uma distribuição e controle das mercadorias a partir do funcionamento de um Estado comunitário e dos trabalhadores, ou morreremos nesta tentativa. 
Entendo que é difícil fazer uma previsão neste contexto, mas também tenho de perguntar: o que se pode esperar? Que suposições sobre a evolução dos acontecimentos te parecem plausíveis? 
Sim, é muito difícil fazer uma previsão. Eu não tenho previsões Deixe-me despedir-me desta entrevista com o nosso lema e razão de ser: “Luta e luta, não pares de lutar, por um governo de trabalhadores, de trabalhadores e popular. 
O original encontra-se em https/www.aporrea.org/venezuelaexterior/n338171.html . Tradução de DVC. 
Publicado por http://resistir.info/ . 

 

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